O efeito da urbanização sobre a temperatura, conhecido como efeito de ilha urbana, já é nosso conhecido: as cidades são geralmente mais quentes do que as zonas rurais. Mas há outro fenómeno “gémeo” com consequências igualmente importantes – o desenvolvimento urbano é responsável pela maior quantidade de chuva numa área.

Num estudo recente publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences, investigadores da Universidade do Texas, em Austin, analisaram 1.056 cidades em todo o mundo e descobriram que mais de 60% têm mais precipitação do que as zonas rurais circundantes. Em Houston, por exemplo, a diferença entre a cidade e o campo chega a quase 12 centímetros anuais.

Um fenómeno que pode agravar o risco de inundações repentinas em áreas densamente urbanizadas.

Fortes chuvas no sul da China em junho provocaram as piores inundações na cidade de Guilin desde 1998.

Estudos anteriores já tinham observado variações na precipitação urbana, mas apenas em algumas cidades e nunca numa escala global, explica Xinxin Sui, principal autora e doutoranda na Escola de Engenharia Cockrell da Universidade do Texas. Nesta investigação, a equipa utilizou dados de precipitação de satélites e radares para analisar anomalias diárias de precipitação em 1.056 cidades entre 2001 e 2020.

“Mais de 60% das cidades analisadas registam mais chuva" do que as áreas rurais vizinhas. " A análise também mostrou que estas anomalias são mais acentuadas em climas quentes e húmidos", refere Sui.

São os casos de cidade como Houston, Ho Chi Minh, Kuala Lumpur e Lagos.

“As cidades funcionam como esponjas”

Dev Niyogi, coautor do estudo, explica que “as cidades funcionam como esponjas”, que retiram a chuva de um lado para a concentrar noutro.

“Embora a quantidade total de água seja a mesma, a compressão atmosférica nas cidades faz com que a chuva se concentre em locais específicos” .

Menos comum, algumas cidades recebem menos precipitação que as áreas rurais circundantes, como Seattle, Washington, Jacarta e Quioto, onde a geografia desempenha um papel determinante, com montanhas próximas a desviar os padrões de chuva.

Razões para as cidades terem mais chuva

O professor na Jackson School e também coautor do estudo, Liang Yang, destaca que a presença de edifícios altos nas cidades também influencia a precipitação, ao abrandar o vento e promover a formação de nuvens.

“A convergência de ar nas cidades, causada pela estrutura urbana, aumenta a formação de chuva”, explica

O estudo revela ainda que a densidade populacional está fortemente correlacionada com as anomalias de precipitação, devido à maior concentração de calor e emissões de gases com efeito de estufa.

Para Yang, este fenómeno terá implicações importantes num futuro marcado pelas alterações climáticas.

O aumento da precipitação, aliado às superfícies impermeáveis das cidades, pode resultar num aumento das inundações repentinas” , alerta.

Em maio de 2024, chuvas e inundações que afetaram 425 dos 497 municípios do Rio Grande do Sul fizeram mais de 100 mortos e desaparecidos.