A ciência é muitas vezes vista como um campo distante e complexo, de uma esfera que não é a do cidadão comum. É inacessível, não nos pertence, e acaba por cair no esquecimento, voltando apenas para debaixo dos holofotes em momentos de crise, quando lhe exigimos respostas urgentes, como aconteceu durante a pandemia, por exemplo.

No entanto, cabe-nos a nós – institutos de investigação científica – alterar este paradigma e mostrar como é fundamental promover uma cultura de diálogo entre a ciência e a sociedade.

No mundo de desinformação em que vivemos, a literacia científica e o contacto com conhecimento científico acessível é crucial para que os cidadãos possam tomar decisões informadas sobre questões que impactam as suas vidas e as dos que os rodeiam.

Além disso, o envolvimento de cada um no processo científico é uma peça fundamental nesta relação. É essencial garantir que a ciência está a responder às necessidades e preocupações da sociedade.

A participação ativa dos cidadãos enriquece o conhecimento, oferece pontos de vista e sensibilidades próprias e contribui para a criação de soluções mais adequadas e eficazes. Foi isto que a Fundação GIMM (Gulbenkian Institute for Molecular Medicine) procurou alcançar com a Semana da Mama 2024, uma campanha de sensibilização para o cancro da mama que durante cinco dias levou a investigação científica a duas tendas em forma de mamas na Cidade Universitária e por onde passaram centenas de pessoas.

Neste espaço foi possível fazer perguntas a cientistas, assistir a conversas com médicos e investigadores, especialistas e pacientes. Para além de ficar a saber mais sobre o cancro da mama, cada pessoa podia ainda doar um pouco de si à ciência. E é nesta intersecção que a relação entre a ciência e a sociedade ganha uma nova dimensão: quando falamos sobre ações concretas, como a doação de sangue para o Biobanco.

O Biobanco desempenha um papel crucial na investigação científica, pois armazena amostras biológicas que são fundamentais para o desenvolvimento de tratamentos e terapias. A sua eficácia depende diretamente da generosidade e da participação da população, para o armazenamento de amostras de pessoas com e sem doença.

Em investigação, uma amostra de uma pessoa saudável é essencial para servir de controlo, ou seja para comparar e entender melhor os mecanismos das doenças. E foram precisamente estas – as amostras de pessoas saudáveis que à partida não teriam motivação para doar – que estiveram a ser recolhidas durante estes dias. Foi até possível recolher várias amostras de pessoas que tinham já doado no ano passado e que voltaram a doar, permitindo ter assim ter recolhas da mesma pessoa em diversos momentos da vida, o que possibilita conclusões mais robustas.

Doar sangue para o Biobanco não é apenas um ato altruísta; é sobretudo uma forma de cada cidadão participar ativamente no processo científico e contribuir para avanços que podem beneficiar a sociedade como um todo.

A motivação para contribuir varia de pessoa para pessoa, mas tem um denominador comum: todos acreditam que estão a fazer a diferença na luta contra doenças e na melhoria da saúde pública. E estão.

A Semana da Mama 2024 foi um sucesso, não só pelo número de participantes ou amostras recolhidas, mas também porque demonstrou, mais uma vez, que a ciência e a sociedade podem – e devem – caminhar lado a lado.

Quando a ciência envolve as pessoas e estas se envolvem na ciência, criamos um ciclo virtuoso de partilha de conhecimento, de responsabilidade e de progresso. Cada um de nós pode contribuir e, acima de tudo, cada um de nós pode sentir o que é estar na vertigem da descoberta.

Mariana Matos

Coordenadora da Semana da Mama