PARIS – De cócoras e as mãos à frente da boca aberta de espanto.

Patrícia Sampaio tinha acabado de conquistar a medalha de bronze na categoria dos -78kg dos Jogos Olímpicos, mas ainda não acreditava.

Depois de um dia em que praticamente não se lhe tinham visto emoções, parecia que estava para demorar a cair em si.

Sim, houve lágrima. Houve depois também um salto para a bancada, onde estavam amigos e familiares que a receberam em êxtase depois de a judoca conquistar a primeira medalha da comitiva portuguesa em Paris 2024.

Mas quando chegou à zona mista para falar com os jornalistas sobre aquilo que acabara de acontecer, Patrícia Sampaio era mais o rosto da incredulidade do que de alegria.

A justificação e toda a conversa seguiu num tom zen. Que parecia mais o de alguém que tinha acabado de acordar, do que de uma recém-medalhada olímpica.

«Ainda não me parece real. Acho que só quando me puserem a medalha ao peito, quando lhe tocar, quando lhe der uma dentada, é que vou perceber que realmente é minha; que vou levá-la para casa; que que a conquistei mesmo. Isto parece tudo um sonho. E era um sonho! Agora parece que é realidade», atira num sorriso tímido.

Tinha razão no que dizia. E ninguém demorou muito a perceber.

A emoção veio toda depois. Já sem kimono azul com que vencera a japonesa Rika Takayama no combate pela medalha de bronze. Agora era um fato de treino que trazia vestido.

Talvez tirar o peso do fato de judo tenha feito cair a ficha. Certo é que na reentrada da Arena para a cerimónia de entrega de medalhas, Patrícia limpa os olhos uma vez. Limpa outra. Respira fundo. Olha para os amigos e familiares na bancada, dirige-lhes um coração com as mãos e ainda tenta segurar-se.

Até que escuta o seu nome no altifalante. É no movimento da subida ao pódio que as lágrimas ganham vida própria, escorrendo no rosto da judoca.

É verdade! Ela está mesmo no pódio olímpico. E chora de alegria. Liberta finalmente toda a tensão acumulada num dia louco em que despachou três combates num acumulado de pouco mais de dois minutos, antes de ser afastada da luta pelo ouro pela italiana Alice Bellandi, líder do ranking mundial e que se sagraria campeã olímpica depois.

A atleta de 25 anos tinha assumido instantes antes que tinha um plano para aquele dia. E que não se desviou dele um segundo. No tatami, era só ela contra ela mesma. Nada mais existia.

Daí a cara que, certamente, não a fará ganhar muitos amigos. A expressão que foi partilhada à exaustão e que mostra alguém que mete respeito. Mete muito respeito! Mas era uma cara de compenetração e foco. Não de agressividade.

«Eu estava muito decidida a manter o foco e a determinação, independentemente do que acontecesse. Mesmo quando perdi a meia-final, não deixei que isso me afetasse. Saí do combate, limpei a cabeça e ‘vamos para um combate novo!’ E acho que isso foi muito importante», descreveu.

Pelo caminho, a tomarense tinha provocado uma desilusão aos milhares de franceses presentes na Arena de Bercy, ao eliminar a vice-campeã olímpica, Madeleine Malonga, logo no segundo combate. Mas garantiu que nem ouviu o entusiástico público gaulês.

«Nem ganhar à atleta francesa me afetou. Nada mudou porque eu estava a lutar comigo mesma. Não me importava a cara, porque a luta era comigo. Não ouvia o público francês a gritar contra mim. Não havia nada: apenas eu e aquilo que eu tinha para fazer», assegura.

Aliás, a luta maior até aconteceu na habitual pausa entre as sessões da manhã e da tarde.

«Essa foi outra luta. Entre descansar, controlar a ansiedade, mas não querer desligar completamente… Eu tinha de manter a atitude. Mas é complicado. Deitei-me um pouco para tentar descansar, mas virava-me para um lado e para o outro e não conseguia dormir. Consegui repousar um bocadinho e mesmo assim manter os meus níveis de energia altos», descreveu.

A noite depois de conquistar a medalha talvez também seja semelhante. Afinal, Patrícia Sampaio coloca o seu nome ao lado do de outros três medalhados olímpicos no judo.

A partir de agora, fala-se de Nuno Delgado, de Telma Monteiro, de Jorge Fonseca e de Patrícia Sampaio. Está na história.