PARIS – A ginástica artística é das mulheres. A faltar cerca de uma hora e meia para a final da trave, na qual Simone Biles ia procurar a quarta medalha de ouro em Paris 2024, há filas e filas nas imediações da Arena de Bercy.
Lá dentro, os corredores estão cheios de gente também. Mas as bancadas têm muitos (mesmo muitos!) lugares vazios.
E sim, ainda faltam quase 90 minutos para as oito finalistas subirem à trave. Mas está prestes a começar a final masculina de barras paralelas!
E aquilo que parece é que as pessoas que enchem os corredores só quiseram assegurar que entram a tempo da final de Biles. Não querem saber muito do que fazem os homens.
E se é verdade que já são muito mais aqueles que veem o chinês Jingyuan Zou fazer o exercício que lhe vale o ouro olímpico, só mesmo com o aproximar da hora da final feminina é que as bancadas de Bercy ficam totalmente lotadas.
Há muitos brasileiros a torcer por Rebeca Andrade, mas é mais do que óbvio: a maior parte das pessoas que ali estão querem ver Simone Biles inscrever ainda mais o seu nome na história.
Afinal, no último dia da ginástica artística em Paris 2024, a norte-americana tem a possibilidade de chegar às nove medalhas de ouro, o que lhe permitiria igualar a ginasta russa Larissa Latynina e a nadadora norte-americana Katie Ledecky, no topo das mulheres com mais títulos olímpicos.
Só que numa prova de muitos, muitos nervos, na qual quatro das oito finalistas caem da trave, Biles mostra que, afinal, é humana.
Sim, ela já tinha deixado no ar essa possibilidade, quando abdicou de algumas competições para preservar a sua saúde mental. Mas em Paris, com mais de 20 mil pessoas na bancada, a melhor ginasta de sempre mostrou que também erra num aparelho de ginástica.
Pela primeira vez numa competição internacional, a atleta de 27 anos caiu pela primeira vez da trave, o que penalizou bastante a sua pontuação, terminando em 5.º lugar na final que foi vencida pela italiana Alice D’Amato, seguida da chinesa Yaqin Zhou e da também italiana Manila Esposito.
Quanto ouro vale uma vénia de Biles?
Menos de duas horas depois, porém, Biles volta a entrar na arena para nova competição. Acena à saída do túnel e distribui sorrisos.
Não há dúvidas, Biles vai em busca de repetir exatamente os mesmos quatro ouros que conquistou no Rio de Janeiro. Já conseguiu o individual e o de equipas no all-around, juntou-lhe outro no salto e falta o do solo.
No aquecimento, uma queda da norte-americana ainda causa um bruááá. Simone sai a queixar-se novamente da perna esquerda, como já tinha acontecido no all-around.
Mas chega a hora do exercício e UAU! A potência habitual, a dificuldade inatingível pelas adversárias e, o mais importante: o sorriso após cada um (daqueles) saltos que só ela é capaz de fazer.
Em dois deles, sai da zona regulamentar e sabe que isso a vai prejudicar, mas está contente com aquilo que fez. E não desfaz o sorriso nem quando percebe que os 14.133 ficam 33 décimas aquém da nota conseguida por Rebeca Andrade.
É a brasileira, que Biles relegara para o 2.º lugar no salto e no all-around, que conquista o título no solo. Mas Biles vai ainda muito a tempo de celebrar como se fosse mais uma vitória sua o bronze conseguido pela compatriota após o protesto de uma nota no exercício de Chiles que fechou o concurso.
E a rivalidade entre Biles e Rebeca? isso não existe. E a prova, terá valido quase tanto como a medalha de ouro que a brasileira vai levar para casa.
No momento mais ansiado, de lágrimas nos olhos para subir ao lugar mais alto do pódio, Rebeca Andrade recebe um gesto inesperado. Biles e Chiles, num momento claramente preparado, fazem-lhe uma vénia quando ela está a juntar-se no pódio. As lágrimas transformam-se num sorriso gigante nas três atletas.
Mais um daqueles momentos que vai marcar estes Jogos Olímpicos.
Que vénia!