Os clubes profissionais querem que volte a ser autorizada a venda de bebidas alcoólicas nos recintos desportivos. O tema tem estado em cima da mesa e voltou a ser abordado recentemente, no último Thinking Football Summit.

A questão é sensível e tem óbvios prós e contras. O certo é que a lei portuguesa há muito que proíbe o consumo de álcool nas bancadas, numa medida que não é uniforme a nível europeu.

A perspetiva pessoal

Sobre esta matéria, devo ser muito honesto: por princípio, sou anti-álcool. É uma opção, uma forma de ser e de estar na vida. Quem me conhece sabe que não bebo, nunca bebi, não toco, nunca toquei em nada que tivesse teor alcoólico. E é precisamente por isso que consigo reconhecer que esta visão extremada não pode nem deve ser imposta à dos outros, sobretudo aos muitos que bebem com equilíbrio, razoabilidade e moderação.

O meu problema com o álcool é muito claro: por ter a capacidade de alterar o estado físico, psíquico e emocional, pode ser, como tantas vezes é, causador de problemas entre pessoas. E como se sabe, alguns eventos desportivos como o futebol são ponto de encontro de milhares de adeptos, que ficam durante horas encostados uns aos outros, assistindo a um jogo que pode potenciar tensão, intolerância e irritabilidade. Ora, se a isso juntarmos o consumo autorizado de substâncias capazes de adulterarem a razão, o resultado pode ser não ser bom (como tantas vezes não foi).

Apesar da escassez de estudos fidedignos nesta matéria, a verdade é que o consumo não controlado de álcool é suscetível de causar problemas de segurança para quem bebe e para quem os rodeia, gerando provocações, conflitos e até agressões que a modalidade bem dispensa.

Por alguma razão existe uma proibição legal.

A perspetiva dos clubes

Os clubes defendem a sua posição e interesses, o que é legítimo.

Sentem que estão a perder fonte de receita importante (e é verdade que, por aí fora, há quem fature muito dinheiro com esta opção) e sentem-se discriminados: é que, além desta possibilidade ser permitida em alguns países, por cá a proibição é apenas nas bancadas, não sendo extensível aos camarotes. Ora isso cria a ilusão que a sede e prazer de uns é mais importante do que a sede e prazer de outros. Ou que há adeptos de primeira e adeptos de segunda. Não faz sentido, de facto.

Devo dizer que não concordo com alguns dos argumentos, como o que refere que a medida é inócua porque “os adeptos bebem livremente nas imediações do estádio”.

Não confundamos as coisas: uma coisa é o que acontece na via pública, outra é aquilo que deixamos que aconteça na nossa casa. Se eu estou a fazer dieta e como doces na rua, ajuda não comer mais dentro de casa, senão duplico a possibilidade de engordar. Um dano é metade de dois. E no caso concreto, essa pode ser a diferença entre saciar a sede com amigos antes da bola começar ou embebedar-me lá dentro e asneirar.

Já a questão da venda de álcool potenciar a ida de mais gente ao futebol, bem, é encontrar formas alternativas de atrair adeptos (e o que não faltam por aí são bons exemplos para replicar).

A verdade é que os clubes são responsáveis pelo que acontece no seu espaço e devem impedir o acesso de pessoas visivelmente inebriadas para o interior dos estádios.

A solução

O tema é mesmo sensível e deve voltar à mesa para ser discutido com cabeça, tronco e membros por quem de direito. Se for encontrada forma eficaz controlar a ingestão de álcool nos recintos (por exemplo, através da venda bebidas com baixo teor de álcool, limitado por pessoa e proibida em jogos de risco), não me choca que a proibição possa ser levantada.

Mas acho realmente que deve haver pensamento sério, que se traduza em algo palpável, que defenda não apenas os clubes e os seus adeptos, mas sobretudo o desporto.

E sejamos sinceros, ‘desporto’ e ‘álcool’ na mesma frase não bate certo.

Aqui há uns anos, restaurantes, bares e discotecas temiam pelo seu futuro perante a proibição de fumar em espaços fechados. Hoje continuam a existir restaurantes, bares e discotecas.