A paixão de uma vida
José Ricardo é uma figura central no basquetebol poveiro. O seu percurso como treinador do CD Póvoa, clube da principal divisão do basquetebol em Portugal, reflete uma dedicação que vai muito além do desporto. São 28 temporadas - não consecutivas - de ligação ao clube. «Este é o meu clube, é o clube da minha terra», partilha, em entrevista a A BOLA. Embora tenha nascido na Póvoa de Varzim, José Ricardo considera-se um poveiro de coração, alguém que sempre viveu a poucos minutos do pavilhão e que se habituou a frequentá-lo diariamente. «Há uma grande afetividade, não só em relação ao basquetebol como em relação a todas as outras modalidades do clube», explica. Para ele, o CD Póvoa é mais do que uma equipa – «é um reflexo da comunidade e da cidade.»
Foi em Moçambique que começou a desenvolver a sua paixão pelo basquetebol, durante os torneios amadores. «Era uma competição entre escolas e foi ali que comecei a perceber o que era o basquetebol, mas a minha ligação profunda com o desporto nasce mesmo aqui na Póvoa», explica. Quando chegou a Portugal, explorou outras modalidades – voleibol, andebol – mas acabou por se fixar no basquetebol, um desporto que lhe parecia ressoar de maneira especial. O seu papel como treinador vai além do campo e da tática: José Ricardo quer que o CD Póvoa sirva de inspiração para os jovens da cidade. «O nosso clube é um símbolo. Queremos que os jovens sintam que aqui têm um futuro e que é possível chegar à primeira equipa», afirma, deixando claro o seu compromisso com o desenvolvimento da formação, uma vez que também é professor de Educação Física no Ensino Secundário.
José Ricardo enfrenta um desafio constante: o de gerir uma equipa que muda regularmente e que precisa de tempo para crescer. Apesar das dificuldades e da falta de recursos financeiros para manter os jogadores estrangeiros, não se deixa desanimar. «Sabemos das dificuldades financeiras do clube, mesmo com a Câmara Municipal da Póvoa de Varzim a dar um apoio tremendo ao clube», lamentando que «as empresas, o turismo e as forças vivas da cidade não apoiem mais». O treinador encara, contudo, este cenário como parte da sua missão de fazer com que o CD Póvoa continue a desenvolver talentos locais. «Não fazemos distinção entre os jogadores da nossa cantera e os de fora. Cada um tem o seu valor e é tratado com o mesmo rigor», garante.
Com um longo histórial no basquetebol feminino, mais até do que no masculino, José Ricardo não hesita em sublinhar as diferenças. «O basquetebol feminino é mais táctico e técnico, enquanto o masculino tem um ritmo muito mais elevado e mais físico». Para o treinador, as jogadoras têm, muitas vezes, uma abordagem mais detalhista e precisa, o que é fundamental para o sucesso do basquetebol feminino. «O que as atletas do basquetebol feminino têm de especial é a forma como conseguem organizar o jogo, o tempo e a defesa de forma muito mais estratégicas. O basquetebol feminino deve ter mais espaço e mais atenção, porque têm tanta qualidade quanto o masculino», sublinha, antes de realçar que aos jogadores de equipas masculinas há que «motivá-los para as questões onde eles são piores, que é, obviamente no trabalho coletivo».
Uma caminhada ao lado do pai
O envolvimento de Miguel Rodrigues com o CD Póvoa foi inevitável, uma extensão natural da influência do pai. Cresceu a treinar e a absorver os ensinamentos transmitidos ao longo dos anos, tanto no clube quanto em casa. O facto de ser treinado pelo pai representa uma experiência singular, compreendendo as complexidades dessa relação. «O meu pai nunca nos deu tratamento diferenciado. Aqui, todos somos iguais e todos temos de provar o nosso valor em campo», garante. Tal como os seus colegas, empenha-se «ao máximo». A igualdade de tratamento no clube é uma das questões que mais valoriza. «Para nós, filhos do treinador, a maior prova é conseguir jogar com o mesmo nível de exigência que todos os outros», afirma com convicção.
Para o jovem atleta, a oportunidade de jogar pelo CD Póvoa representa uma conexão profunda com a cidade e com a sua própria história familiar. «Cada jogo é uma ocasião para honrar o legado do meu pai e também da cidade», diz, considerando que o sucesso do clube não se mede apenas pelos troféus, mas pelo impacto positivo que tem na comunidade. «É uma responsabilidade enorme representar o clube e os adeptos, mas é também uma grande honra.»
Sob a orientação do pai, Miguel aprendeu a importância do treino contínuo e da preparação para enfrentar adversários mais fortes. «O meu pai sempre nos ensinou que o trabalho árduo, dia após dia, é o que nos coloca na linha da frente», afirma o extremo de 23 anos.
No lado pessoal, além do basquetebol, Miguel Rodrigues está a concluir o mestrado e o doutoramento em Engenharia Civil. Brinca que gosta mais de basquetebol do que dos estudos, mas destaca que a Engenharia Civil sempre lhe despertou interesse devido à sua afinidade com a matemática. Fora do campo e dos estudos, os hobbies de Miguel resumem-se ao basquetebol – «respira-se basquetebol, 24 horas por dia» na sua família.
O legado e o conselho do pai
Jorge Rodrigues, o segundo filho de José Ricardo e irmão mais novo de Miguel, partilha o mesmo amor pela modalidade e pela cidade, mas vê o desporto de uma perspetiva diferente. «O conselho de pai é sempre aquele que nos marca mais», admite, após ser confrontado sobre qual o papel mais importante do progenitor na sua vida.
Tal como o irmão, Jorge sente que não recebe tratamento especial em campo. «Sabemos que estamos todos a lutar pelo mesmo objetivo: o sucesso da equipa». O base de 21 anos destaca o papel da mentalidade coletiva na formação da equipa. «Neste clube, não há individualidades. O nosso sucesso depende de todos e de cada um», afirma.
As ambições são claras e envolvem grandes metas no desporto. «O sonho desde pequenino é a Euroliga», referindo-se à principal competição europeia de clubes. «É o sonho máximo que eu alguma vez tive e continuo a ter. Outro objetivo que eu também tenho é representar a seleção e ganhar a Liga Portuguesa de Basquetebol ao serviço do CD Póvoa»
Ao olhar para o passado, Jorge recorda o momento mais feliz da sua carreira até agora: «Provavelmente a nossa subida à Liga. Foi algo histórico para o clube e para a cidade». Essa conquista aconteceu durante o período da pandemia de Covid-19, o que impossibilitou a presença dos adeptos nas bancadas. «Apesar de não podermos ter os nossos adeptos a ver os jogos, conseguimos ter uma receção cá quando fomos campeões, e foi um momento que me marcou bastante».
Jorge Rodrigues está atualmente no terceiro ano de Engenharia Física, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, conciliando os estudos com o basquetebol. Embora seja uma pessoa «muito ligada aos números, física e matemática», encontra nos videojogos uma forma de «relaxar fora do basquetebol e dos estudos». Com o comando da televisão sempre nas mãos do pai, não há muito espaço para outros desportos, mas ainda assim ocasionalmente assistem a jogos de andebol, modalidade que praticou por seis anos.
Olhando para o caminho percorrido pela família no basquetebol, a mãe Gabriel Cunha, também ex-atleta do clube, partilha o seu orgulho e a sua ligação com o clube. «A paixão pelo basquetebol é algo que me acompanha há muito tempo e ficará para sempre! Também eu tive o orgulho de jogar por este clube e de ter sido treinada pelo atual treinador dos meus filhos». Com um sorriso, acrescenta: «Família Rodrigues, façam com que, em minha casa, se continue a respirar basquetebol!»