Paris – A reação corporal de Gabriel Albuquerque na zona mista após conseguir o melhor resultado de sempre da ginástica de trampolins portuguesa mostra logo o carácter daquele miúdo de 18 anos, com uns pelos rebeldes no queixo.

A questão é precisamente sobre o 5.º lugar alcançado minutos antes, que supera o 6.º lugar conseguido por Nuno Merino, em Atenas, há 20 anos, quando ele nem era nascido.

Sim, é o melhor resultado de sempre, mas o esgar e o sorriso de Gabriel não enganam: para ele foi curto! «Às vezes, um gajo deixa-se levar»… mas a pausa de seis segundos que o miúdo faz antes de responder traz-lhe a lucidez de não desvalorizar.

«É uma sensação incrível, apesar de eu saber que sou ainda melhor do que isto. Mas é bom saber que já agarro um registo histórico na minha primeira prova olímpica. Isso é incrível», atira, elogiando os rivais que ficaram à sua frente, sobretudo os medalhistas.

«Soube-me a pouco. Sou uma pessoa muito ambiciosa e gosto de sonhar. Mas estes três merecem».

A sensação agridoce de Gabriel tinha uma razão de ser. Ele tinha preparado uma rotina para lutar pelas medalhas, mas teve de adaptar depois de um salto do exercício não lhe ter permitido seguir o plano mais arriscado.

«Era suposto fazer uma série mais complicada, ali senti-me à rasca no quarto salto, e aí é que era paa fazer uma coisa mais difícil e ir atrás de uma medalha. Mas não consegui e em milésimos de segundo tive de decidir agarrar-me à série mais simples para acabar concluir. Caso contrário, não ia dar», revelou.

Ainda assim, o mais novo dos portugueses em prova em Paris 2024 não tem dúvidas de que o nível dele já é o dos adversários que nesta sexta-feira subiram ao pódio.

«Eu posso parecer convencido por dizer isto, mas não estou a ser mesmo. Sei das minhas capacidades e sei que estou ao nível daqueles gajos. Eles, neste momento, foram melhores que eu, mas foi só isso», garante.

No caminho até Paris do miúdo que começou nos trampolins aos quatro anos, houve uma mudança de rota para que o sonho pudesse vir a ser realidade.

Aos 11 anos, Gabriel convenceu a mãe a mudarem-se ambos de Almada para Loulé de forma a ele poder continuar a treinar com João Pedro Monteiro, que esteve com ele desde o início, até a este momento alto nos Jogos Olímpicos. E o ginasta não tem dúvidas de que foi a decisão certa.

«Claro, claro! Tem valido muito a pena. Este processo todo tem vindo a ser com altos e baixos. Mas tem sido um trajeto incrível. Não mudava nada do que fiz até agora. E valeu muito a pena ter-me mudado, até porque adoro aquela cidade», revela.

Gabriel iniciou-se nos trampolins para gastar o excesso de energias de uma criança hiperativa e hoje não consegue imaginar a sua vida longe dos saltos mortais e piruetas encarpadas.

«Se não fosse isto, se calhar estava a trabalhar no Mc Donald's… estou a gozar! Pronto, já vou ser cancelado! Era rapper, de certeza que era rapper», brincou.

Mais a sério foi o momento em que falou da relação com o técnico que o fez mudar-se para o Algarve.

«Uma das coisas que faz o momento ficar ainda muito mais especial é ter ali o João. É uma pessoa que me acompanha desde que eu tenho quatro ou cinco anos. Estar com ele ao meu lado nos Jogos Olímpicos, a maior prova dos trampolins, é simplesmente incrível. Não podia escolher uma pessoa melhor para este momento», sublinha.

Outra pessoa que esteve a acompanhar tudo ali ao lado foi Nuno Merino, que tinha até esta sexta-feira o melhor resultado em Jogos Olímpicos e que Gabriel revelou ter provocado mal saiu do trampolim e o abraçou. «Disse-lhe logo: já foste!»