O rendimento disponível real das famílias em 2024, descontando já os efeitos da inflação, deverá acelerar de forma histórica para os valores mais elevados desde, pelo menos, o início do século, graças à resiliência do mercado de trabalho, aumento de pensões e à redução do IRS, segundo o Banco de Portugal. Contudo, a instituição liderada por Mário Centeno reviu em baixa o crescimento da economia portuguesa para este ano e para o próximo devido sobretudo ao menor crescimento do consumo privado.

“O rendimento disponível real deverá crescer 6,6% em 2024, uma taxa elevada em termos históricos, que resulta da situação favorável do mercado de trabalho — em termos de emprego e salários reais —, do aumento das pensões e outras transferências e do impacto da redução do IRS”, pode ler-se no Boletim Económico de outubro, publicado na manhã desta terça-feira.

No mesmo documento, o Banco de Portugal informa que, para os anos seguintes, “projeta-se um crescimento mais contido do rendimento disponível real (1,9%, em média), refletindo a desaceleração da massa salarial e a dissipação dos efeitos das medidas orçamentais incluídas na projeção, recomendável dada a necessidade de assegurar o equilíbrio das finanças públicas, que tem beneficiado nos últimos anos de elevados excedentes da Segurança Social”.

A taxa de poupança aumenta para 11,5% este ano (8% em 2023), um valor também “historicamente elevado” num contexto não recessivo, e nos anos seguintes este indicador deverá estabilizar num valor próximo de 11%.

Banco de Portugal menos otimista

Até aqui, as estimativas do Banco de Portugal para a evolução da economia portuguesa eram as mais otimistas. Mas, três meses depois, o supervisor liderado por Mário Centeno reviu em baixa as projeções para o crescimento da economia portuguesa este ano e no próximo, segundo o Boletim Económico, refletindo sobretudo um abrandamento do consumo privado. As previsões para taxa de desemprego e para a inflação mantêm-se praticamente estáveis face às últimas estimativas, de junho.

Assim sendo, o crescimento do PIB (produto interno bruto) deverá fixar-se nos 1,6% este ano (face à anterior previsão de 2%) e em 2,1% no próximo ano (a anterior estimativa apontava para 2,3%). Em causa está sobretudo uma revisão em baixa do consumo privado, uma tendência comum a toda a área do euro, que agora deverá crescer apenas 2% em 2024 e 1,9% em 2025, comparando com a projeção de junho que apontava para 2,5% e 2,3%, respetivamente.

De qualquer forma, o documento salienta que “a economia portuguesa mantém um crescimento equilibrado no horizonte de projeção” e “o dinamismo do rendimento disponível continuará a refletir uma evolução favorável do mercado de trabalho, com aumento do emprego e dos salários, e o impacto das medidas orçamentais”. O Banco de Portugal acrescenta que “o contributo do consumo privado no período é consistente com uma estabilização do seu peso no PIB, em termos reais, e um aumento da taxa de poupança”.

Acelerar PRR é "crucial"

No mesmo documento, o Banco de Portugal dedica um capítulo à execução atual do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), notando que “os resultados apresentados destacam que, embora Portugal tenha feito progressos significativos na execução do PRR, é crucial acelerar a execução dos projetos para atingir os objetivos estabelecidos”.

“A recente disposição da Comissão Europeia para flexibilizar a implementação dos projetos financiados pelo PRR oferece uma oportunidade valiosa para enfrentar desafios imprevistos e garantir a continuidade dos investimentos. Neste sentido, a monitorização contínua e a adaptação das estratégias de implementação revelam-se essenciais”, acrescenta o boletim do Banco de Portugal.

Portugal é o quinto país da área do euro que irá receber mais fundos em percentagem do PIB. São 10,4% do PIB de 2019, o que equivale a 22,2 mil milhões de euros (16,3 mil milhões de euros em subvenções e 5,9 mil milhões de euros em empréstimos). Os PRR estão estruturados em torno de três dimensões: transição climática, transição digital e resiliência. Pelo menos 37% dos fundos devem ser destinados a medidas verdes e 20% a iniciativas digitais.

Até ao momento, Portugal recebeu quatro tranches, o que corresponde a 38% da dotação e atingiu 23% dos marcos e metas, sendo o cumprimento mais exigente nos últimos pedidos de pagamento. Dos fundos do PRR, 87% foram aprovados e 24% pagos aos beneficiários. Mais de metade dos fundos destinam-se ao setor do Estado, mas os pagamentos avançam mais rapidamente no setor privado, nota o Banco de Portugal.