O conselho do Banco Central Europeu (BCE) decidiu esta quinta-feira cortar, pela terceira vez, as taxas diretoras na reunião realizada em Liubliana, na Eslovénia. O banco central aprovou um corte transversal de 25 pontos-base no quadro de taxas, descendo a taxa de remuneração de depósitos, atualmente considerada a de referência para a política monetária, para 3,25% e a taxa de refinanciamento para 3,4%. A decisão foi tomada por unanimidade.

O BCE justifica a decisão avançando que “a informação que tem vindo a ser disponibilizada sobre a inflação indica que o processo desinflacionista está bem encaminhado” e que. “as perspetivas de inflação também são afetadas por recentes surpresas em baixa dos indicadores da atividade económica. Por seu lado, as condições de financiamento permanecem restritivas”.

Uma boa notícia alegrou o segundo dia de reunião do BCE em Liubliana. O Eurostat reviu, esta quinta-feira, em baixa a inflação na zona euro para setembro. Na segunda estimativa publicada pelo organismo de estatística da União Europeia, a inflação global desceu para 1,7%, o nível mais baixo desde abril de 2021, e a inflação nos serviços abrandou para 3,9%, o ritmo mais baixo desde abril passado. Em relação à primeira estimativa avançada a 1 de outubro, as correções em baixa foram de uma décima.

Mas sobre a trajetória futura dos juros, o BCE reafirma que “não se compromete previamente com uma trajetória de taxas específica”, e que as decisões serão tomadas reunião-a-reunião.

Os banqueiros do euro admitem que “a inflação deverá subir nos próximos meses, descendo depois para o objetivo no decurso do próximo ano” Referem, ainda, que. “a inflação interna se mantém alta, porque os salários ainda estão a aumentar a um ritmo elevado”, mas preveem que “ao mesmo tempo, as pressões sobre os custos do trabalho deverão continuar a registar um abrandamento gradual, com os lucros a amortecer parcialmente o impacto dessas pressões na inflação”.

Recorde-se que o BCE iniciou o ciclo de descida de juros em junho passado e repetiu a dose em setembro, com cortes por reunião de 25 pontos-base. O alívio monetário começou em meados de 2024 depois de uma escalada nas taxas de julho de 2022 a setembro de 2023, que aumentaram os juros em 450 pontos-base (4,5 pontos percentuais).

Os futuros preveem uma descida para menos de 3% na taxa de remuneração de depósitos até final deste ano e projetam a chegada a uma taxe neutral (nem restritiva, nem expansionista) de 2% em julho de 2025. Para a reunião de 12 de dezembro, há uma probabilidade de 93% para mais um corte de 25 pontos-base.

Em outubro, nas 17 reuniões de bancos centrais já realizadas, oito já optaram por um corte de juros, com destaque, nas economias desenvolvidas, para a Islândia, Coreia do Sul, Nova Zelândia e Zona Euro.

Trajetória incerta da inflação e economia da zona euro frágil

O conselho do BCE está confrontado com dois riscos com implicações contrárias para a política monetária: a inflação pode regressar às subidas por causa da geopolítica, implicando travar o corte de juros, e a economia na zona euro pode degradar-se ainda mais, o que exige um alinhamento entre uma política monetária menos restritiva e uma política orçamental mais amiga do crescimento económico.

A inflação desceu na zona euro de 2,2% em agosto para 1,7% em setembro, em termos homólogos, ou seja, em relação ao mesmo mês do ano passado. A segunda estimativa do Eurostat publicada esta quinta-feira confirma que a inflação desceu abaixo da meta da política monetária do BCE pela primeira vez desde junho de 2021.

A inflação subjacente desceu ligeiramente de 2,8% para 2,7% no mesmo período e mantém-se muito acima da meta global dos 2%. A inflação subjacente exclui as componentes mais voláteis do índice de preços, como a energia (cujos preços caíram 6,1% em setembro).

O nível de inflação no sector dos serviços desceu de 4,1% em agosto para 3,9% em setembro, mantendo-se, no entanto, muito alto em relação à inflação global.

Contudo, os riscos concentram-se na trajetória da inflação no sector de energia, cujos preços podem regressar a uma escalada no caso do agravamento das condições geopolíticas. A turbulência geopolítica e o protecionismo podem, também, escalar os preços de bens industriais transacionados no comércio internacional em virtude do impacto nas cadeias de fornecimento global.

A situação económica global na zona euro é, também, muito frágil, como sublinhou Philip Lane, o economista-chefe do BCE, a 16 de setembro, no encontro dos economistas-chefe do Banco Europeu de Investimento. A área da moeda única desacelerou no segundo trimestre, com o crescimento a baixar para 0,8%. Na Alemanha, a principal economia do euro, a economia regista há dois trimestres seguidos uma ligeira contração. A Irlanda e a Finlândia estiveram em recessão no primeiro semestre e a Áustria registou uma contração nos primeiros três meses do ano e estagnação no segundo trimestre. A França, a segunda maior economia, desacelerou no segundo trimestre para perto de 1% e a Itália, a terceira maior economia do euro, cresceu menos de 1% entre abril e junho. As duas economias com melhor desempenho foram, no segundo trimestre, Espanha (2,9%) e Portugal (1,5%).

Juros da dívida pública em queda para Portugal

A baixa das taxas do BCE, para além de um impacto na redução das taxas Euribor que influenciam os juros dos empréstimos, tem tido um efeito na descida dos juros da dívida pública na zona euro desde junho, apesar de algumas oscilações.

Os juros das obrigações a 10 anos subiram na zona euro entre a reunião de 12 de setembro e a reunião desta quinta-feira no mercado secundário, onde se transacionam os títulos entre os investidores. Este mercado - distinto do mercado de emissão de dívida pelos Estados - é indicativo. Nos juros de referência, da dívida alemã, subiram de 2,156% para 2,177%, naquele período. Mas desceram de 2,53% no final de junho.

Para o caso da dívida portuguesa a 10 anos, registou-se uma descida, de 2,765% a 12 de setembro para 2,648% na abertura da sessão a 17 de outubro. Esta descida colocou o custo da dívida portuguesa abaixo dos juros pagos pela Áustria e a Bélgica. Portugal ‘graduou-se’ para o ‘centro’ da zona euro, com um spread abaixo de 50 pontos-base (meio ponto percentual) em relação à divida alemã que serve de referência.

Esta quinta-feira, o Tesouro espanhol foi ao mercado colocar dívida a 10 anos e pagou 2,92%, menos do que na operação anterior, e em linha com a taxa no mercado secundário. Portugal não realiza leilões de obrigações desde maio. O Tesouro português já colocou 93% da dívida obrigacionista prevista para 2024.