Pedro Chagas Freitas tem passado os últimos meses com o coração nas mãos (e no hospital) visto que o filho Benjamim foi submetido a um transplante de fígado no passado mês de junto e continua em tratamentos.
O escritor português tem deixado uma reflexão em jeito de desabafo por dia e hoje não foi exceção. “Hoje vai ser um dia cheio de nada”, começou por dizer.
Acordaste a dizer isto a quem te aparecesse no caminho pelo corredor. Dizes com um sorriso, com mesmo com um riso, a acompanhar, como se fosse essa a grande felicidade dos nossos dias. E é. A maior felicidade dos dias aqui, como dos dias lá de fora (um dia vamos voltar a vivê-los, um dia temos de voltar a vê-los, temos, temos, temos), é haver dias cheios de nada. Dias desocupados de algo que os preencha de medo, de angústia, de exames, de cirurgias, de cateteres, de colheitas. A felicidade pode muito bem ser a completa ausências do que só nos enche sem nos completar, do que ocupa espaço mas que não preenche vazios. O grande dia aqui, para ti, para nós, é o dia desabitado do que nos alimenta a ansiedade.
“Amanhã vai haver algum exame ou vai ser só pândega?”
Perguntas, antes de adormecer. Digo-te que vai ser só pândega, e não sei se vai ser mesmo assim (há surpresas a toda a hora por aqui), mas enquanto for possível, sim, vai ser um dia de pândega. Talvez o grande enfermeiro tenha de ser um grande especialista em pândega. Não sei mesmo como não há a cadeira de pândega no curso, em todos os cursos, na verdade. Só a inconsequência nos salva das consequências merdosas do que nos magoa.