Em que consiste o projeto “HelpEpi: Em crise epilética, dá a mão” e de que forma pode ajudar pessoas com epilepsia?
Tal como o nome indica, queremos dar a mão a pessoas com epilepsia. Pretendemos dar formação a professores do segundo ciclo com o intuito de aumentar os níveis de literacia que existem sobre a doença e para que estes também se sintam capazes de agir perante uma crise epilética.

Porém, esta decisão foi estratégica. Escolhemos os professores porque sabemos que têm fácil acesso a várias turmas, a vários alunos e neste caso a crianças, que era o nosso alvo. Nesta fase do desenvolvimento humano existe uma maior capacidade de compreender, reter e saber aplicar conhecimento. Sabemos que as crianças são o futuro da sociedade e, nesse sentido, queremos formatá-las para se sentirem capazes de agir perante uma crise epilética. Ao reter esta informação numa fase precoce, as crianças conseguem depois aplicar o conhecimento nas várias fases do ciclo de vida.

Assim, estamos a ajudar pessoas com epilepsia um pouco de forma indireta, mas direta, porque ao fazer com que as crianças tenham mais conhecimento e se sintam mais capazes de agir, também as pessoas com epilepsia vão estar mais tranquilas, porque sabem que podem estar inseridas em diversos contextos e podem fazer a sua vida normalmente, pois, caso sofram uma crise epilética, muito facilmente vão ser assistidas.

Algo que também trabalhamos muito nas nossas sessões é o foco em reduzir o estigma e desmistificar crenças errôneas associadas à epilepsia.

“Desmitificamos mitos e reduzimos o estigma através de muito trabalho de empatia, sempre com base na verdade e na evidência científica, que ainda é escassa.”

A implementação do projeto também inclui uma plataforma que permite facilitar a tomada de decisão face a uma crise epilética. Como funciona?
Desde o começo esforçámo-nos para que este fosse um projeto muito completo a nível de planeamento. Quando chegámos à fase de colocar em prática o manual, que inclui e explica esse tal planeamento, tentámos pensar o modo como poderíamos chegar ao máximo de pessoas possível, uma vez que iria demorar até que toda a gente estivesse dotada de formação relativamente à epilepsia.

A pensar nisto, sabemos que atualmente o que cativa as pessoas é o conteúdo rápido, acessível e bem explicado. As pessoas gostam de consumir este conteúdo e pensámos em utilizar as redes sociais e criar uma plataforma, mesmo com o intuito de chegar a outras faixas etárias. Ainda estamos a elaborar esta ferramenta, mas está a ser muito bem pensada.

Pretendemos que seja um espaço em que as pessoas possam trocar ideias, colocar questões e ter logo uma resposta, ou seja, facultar uma assistência personalizada. Além disso, também pretendemos elaborar produtos de comunicação, através da evidência científica, em que o design é cativante e onde o conteúdo está muito bem explicado, com linguagem simples.

A plataforma contará ainda com novidades relativas à doença e iniciativas locais associadas à epilepsia. No fundo, queremos criar um espaço em que as pessoas possam aprender de forma divertida. Foi tudo muito bem pensado de modo a chegar às pessoas e a ajudá-las para ultrapassar estas necessidades existentes e que se sintam capazes de agir e ter fácil acesso a esta informação.

Qual é a importância do aumento da literacia relativamente à epilepsia em Portugal?
Penso que é de conhecimento geral que é incapacitante viver com esta doença e ainda mais incapacitante é não termos muito conhecimento sobre a mesma. A minha área é Psicologia e dor crónica e sei, perfeitamente, quão incapacitante é para os doentes não terem conhecimento sobre a sua doença e o sentimento de injustiça que têm por terem epilepsia.

Se ainda tivermos a agravante de estarmos inseridos num contexto em que, além de já termos todas estas dúvidas associadas à doença, ainda temos à nossa volta pessoas com baixos níveis de literacia sobre a mesma e que, por isso, não nos conseguem ajudar, ainda desmotiva mais a pessoa relativamente à sua doença, resultando numa espiral negativa.

Temos de encontrar formas de aumentar os níveis de literacia, porque só assim é que podemos colmatar as necessidades, nomeadamente esta má gestão e este estigma associado à doença. A comunidade escolar é muito importante neste sentido.

A estatística refere isso mesmo: as convulsões afetam cerca de 10% da população mundial, e, dessa percentagem, 2% são casos de epilepsia. Se as pessoas com epilepsia não tiverem suporte por parte das outras, no sentido de saberem como lidar face a esta doença, existe um risco de os doentes poderem desenvolver outro tipo de perturbações, nomeadamente a nível psicológico.

“Ainda existe uma escassez de literacia associada à epilepsia que temos de colmatar, mas é o princípio de um longo caminho que estamos a percorrer”.

Como surgiu a ideia deste projeto?
Somos todas da área da saúde. Tínhamos casos de epilepsia próximos, com os quais convivíamos diariamente. Falávamos com os mesmos, questionávamos como era viver com e gerir a doença, falávamos sobre como era complicado manter uma vida dentro dos parâmetros normais, sem que fosse condicionada ou sem que fosse necessário encontrar outras opções e estratégias para lidar com a incapacidade que sentiam.

Entre o grupo, falávamos sobre o quão frustrante deveria ser ter a doença, viver com a mesma e como é que poderíamos ajudar estas pessoas e melhorar a sua qualidade de vida. Como trabalhávamos juntas falámos mais sobre o assunto e, a partir daí, fizemos um brainstorming.

“Tentámos ser mais complexas possível na forma como lidávamos com este problema de saúde que é muito atual.”

O que significa o Prémio atribuído e como será implementado?
Era ótimo termos chegado ao prémio principal, ao primeiro lugar, mas o segundo também é, porque o que pretendíamos era ter apoio para conseguir implementar o projeto, porque, hoje em dia, para colocar algo em prática, tal como idealizamos, é preciso este tipo de ajudas.

O prémio vai ser perfeito porque, tal como já foi mencionado, temos a plataforma e vamos precisar de muita ajuda a nível de designers, de engenheiros e de pessoas da área da Comunicação, para chegarmos às pessoas. Vamos ter de criar uma equipa multidisciplinar e tentar perceber como é que vamos, depois, colocar em prática todas as nossas ideias.

Mas, os gastos não se ficam por ai. Temos também o manual, precisamos pagar o ISBN (International Standard Book Number) e vamos publicá-lo, o que também envolve dinheiro. Além disso, temos ainda as formações, outro tipo de pagamento, no caso, das pessoas que nos estão a ajudar, porque se não conseguimos dinamizar o projeto, temos de formar pessoas para o fazer com estes professores, o que envolve muitos recursos.

CG

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