É um recorde mundial, à altura de um clube que formou Cristiano Ronaldo. Na próxima temporada, de acordo com o “Plano Estratégico a 10 anos” recentemente divulgado, o Sporting vai ter nove (!) equipamentos oficiais, e para os adeptos complicado será escolher. Claro que existirá sempre a possibilidade de comprar vários modelos, mas não é preciso ser um visionário para perceber que a maioria dos sportinguistas irá dirigir as atenções para a camisola estampada com o número 9.

Até a esse nível os leões pisam terrenos para uma perspicaz iniciativa comercial. Nove equipamentos lançados na mesma época para o mercado e o artilheiro Viktor Gyökeres a cotar-se, dia após dia, como o maior símbolo do balneário verde e branco. O jogador que ocupa a posição 9, que veste a camisola 9 e que tem uma média de 0.93 golos por partida, continua a espalhar o pânico nos defesas contrários e... quase todos se rendem à sua performance demolidora.

Ao contrário do que aconteceu na primeira jornada da Liga dos Campeões, quando Bruno Génésio, ainda antes de sentir na pele a pontaria do sueco, se referiu ao homem da máscara como “um dos grandes avançados da Europa, que ultrapassa todas as fasquias”, ontem Peter Bosz já não seguiu o caminho do colega do Lille e reservou a maior dose de elogios para Rúben Amorim.

Bruno Génésio, treinador do Lille
Bruno Génésio, treinador do Lille Stephane Mahe

Talvez por uma questão de estratégia ou por mera perspetiva pessoal, o treinador do PSV Eindhoven recusou a ideia de um plano especial para travar Gyökeres no confronto desta noite que vai desafiar o grau de invencibilidade de dois emblemas que só sabem ganhar nos seus campeonatos. Ao invés, o neerlandês, em declarações à Sport TV, fez questão de salientar o “muito respeito” que tem por Amorim, socorrendo-se, inclusive, das memórias de há três anos, quando orientava o Lyon e este perdeu o Troféu Cinco Violinos pela margem mínima (3-2).

“A evolução da equipa é impressionante”, admitiu Bosz, num discurso propagado pelo braço direito Stijn Schaars, uma figura que enquanto praticante ainda causou algum furor em Alvalade graças ao pé esquerdo. “Ele (Rúben)mudou alguma coisa na equipa e dentro do clube, uma certa forma de pensar. Trata-se de um treinador com futuro e boa visão”, destacou à ESPN o antigo médio do pior Sporting da história no que se refere à Liga portuguesa (sétimo lugar em 2012-13).

Peter Bosz, treinador do PSV
Peter Bosz, treinador do PSV HAYOUNG JEON

Daqui a algumas horas, depois de concluído o desafio no Philips Stadion, perceber-se-á qual dos oponentes leoninos esteve melhor na abordagem mediática dos confrontos e se aproximou da verdade. Numa visão necessariamente externa, Génésio e Bosz têm, ao que parece, visões distintas sobre o segredo maior de um adversário de registo impressionante nas principais vertentes do jogo.

Se os 11 golos e as três assistências que o ex-Coventry soma em... 9 desafios de 2024-25 (outra vez a relação especial com o 9...) desencadeiam comparações com as estatísticas de lendas como Fernando Peyroteo, Hector Yazalde, Manuel

Fernandes ou Mário Jardel, por outro lado a extraordinária estabilidade defensiva denuncia que os êxitos individuais e coletivos assentam num trabalho global e desenhado no gabinete técnico.

Muitos zeros e um Zeno

No fundo, a tranquilidade experimentada por Vladan Kovacevic ou por Franco Israel espelha apenas uma das múltiplas provas do autor de uma obra notável e que se mede de baliza a baliza. Com 25 golos marcados em sete jornadas da Eredivisie (fotocópia da produção do líder da Liga Betclic), o PSV tentará hoje quebrar o ciclo impressionante de seis encontros do Sporting sem qualquer tento encaixado, incluindo-se nesta série a vitoriosa receção ao Lille, que também ficou marcada pelo pontapé monumental de Zeno Debast.

Antes desse 2-0 festejado na barba branca de Bruno Génésio, o onze com Kovacevic tinha goleado o Farense (5-0) e vencido o FC Porto (2-0), com Arouca, AVS e Estoril Praia a engrossarem, depois da estreia na remodelada Champions, o lote de candidatos que concluíram sem sucesso a missão de marcar pelo menos um golo a Israel. Apesar de nos três últimos compromissos o resultado ter sido o mesmo (triunfos por 3-0), Viktor, estranhamente, reconheça-se, ficou em branco no último e por isso é de prever que logo esteja motivadíssimo para regressar às famosas celebrações e ajudar a quebrar o espetacular registo dos homens de Eindhoven, em busca do 42.º (!) jogo seguido sem qualquer derrota caseira.

Estão assim criadas as melhores condições para o escandinavo acrescentar outra página a um currículo internacional que o levará mais dia menos dia a abandonar Portugal, ou não reservasse novembro os confrontos com Manchester City e Arsenal e não continuasse a Premier League a ser o destino europeu de eleição para os craques avaliados com três dígitos.

Isto não significa que o possante Viktor não possa sair por 99,999 milhões de euros. Não seria por uma manga de uma camisola que Frederico Varandas desprezaria a possibilidade de um encaixe nunca antes visto. Mais depressa o presidente tentaria inviabilizar o negócio se o mesmo, fosse qual fosse o valor em causa, coincidisse com a saída do treinador.

Gualter Fatia

Caso Alvalade perdesse em simultâneo o jovem técnico e o reputado goleador, o rombo poderia ser irreparável e não haveria “Plano Estratégico a 10 anos” que resistisse. Se calhar era esse o tempo que o leão demoraria para voltar a rugir.

Na prática, Varandas está obrigado a dar razão a Génésio ou a Bosz, vai ter de escolher entre Amorim e Gyökeres, ou seja, vai ter de escolher qual dos dois vende primeiro. Sonhar em preservar a dupla em função da duração dos respetivos contratos significaria daqui a uns meses estar a jogar com... 9.

É melhor tratar do divórcio o quanto antes.