Qual a prevalência da epilepsia em Portugal?
A Liga Portuguesa Contra a Epilepsia tem a decorrer, atualmente, um estudo epidemiológico que nos permitirá obter dados atualizados para a nossa população. Admite-se que, no nosso país, existam entre 40.000 a 70.000 pessoas com o diagnóstico de epilepsia (1 em cada 200 pessoas). Mas o número de pessoas que podem vir a ter uma crise epilética ao longo da vida é muito maior, aproximadamente 1 em cada 20 pessoas. Mundialmente, estima-se que 5 milhões de pessoas são diagnosticadas com epilepsia todos os anos.
Quem é mais afetado?
A resposta a esta questão está muito relacionada com a causa da epilepsia. Existem várias etiologias e formas de epilepsia e, ao longo da vida, a sua incidência vai-se alterando, justificando que existam dois grupos etários em que a incidência da doença é maior: na infância, com uma maior frequência de etiologias genéticas; e na população idosa (>60 anos), com predomínio de formas causadas por lesões estruturais (como AVC, sequelas de traumatismos crânio-encefálicos, tumores, …).
“O controlo das crises epiléticas, com fármacos anticrises epiléticas, permite ao doente ter uma vida sem restrições, embora deva manter alguns cuidados”
Com os tratamentos atuais, de que forma esta doença tem impacto no dia a dia do doente, nomeadamente na vida profissional?
A maioria dos doentes a quem é diagnosticada epilepsia, cerca de dois terços, tem a sua doença controlada com a toma de medicação. O controlo das crises epiléticas, com fármacos anticrises epiléticas, permite ao doente ter uma vida sem restrições, embora deva manter alguns cuidados e evitar situações que podem favorecer a recorrência de crises. Não pode esquecer a toma dos seus medicamentos, deve cumprir descanso regular, evitando a privação de sono, e evitar consumo de álcool.
Do ponto de vista profissional, para um doente que tem a sua epilepsia controlada não haverá qualquer limitação, intelectualmente será tão capaz como qualquer pessoa sem epilepsia. Contudo, em algumas situações, e sobretudo em doentes com maior dificuldade no controlo de crises, podem ser necessários ajustes. A medicação pode causar efeitos secundários, como sonolência ou tonturas, e pode haver necessidade de ajustar horários ou evitar trabalho por turnos. Num doente que não esteja controlado, a recorrência, mesmo que esporádica, de crises, sobretudo quando associadas a perturbação da consciência, como ocorrem de forma imprevisível, podem condicionar riscos para o doente ou para os colegas de trabalho, que têm de ser acautelados. Estes doentes não podem trabalhar em cenários de risco, como trabalho em alturas, utilização de máquinas cortantes ou condução de veículos. Mas reforço a ideia de que a grande maioria dos doentes tem a sua doença controlada, sem impacto na sua capacidade cognitiva, criativa ou produtividade.
“Existe ainda a ideia de que a epilepsia pode causar maior absentismo ou sinistralidade laboral, o que não é verdade e pode condicionar a seleção do trabalhador”
Ainda existe preconceito? Ter epilepsia pode ser uma barreira para se conseguir emprego?
Apesar de pontualmente, e para uma minoria de doentes, serem necessárias algumas adaptações, como referido, estas não são a principal barreira para um doente com epilepsia obter ou manter um contrato de trabalho. O estigma associado à doença, que resulta sobretudo da falta de conhecimento da população em geral e do empregador sobre esta patologia, assim como das suas formas de apresentação ou como atuar perante uma pessoa que está a ter uma crise, são condicionantes maiores. Existe ainda a ideia de que a epilepsia pode causar maior absentismo ou sinistralidade laboral, o que não é verdade e pode condicionar a seleção do trabalhador.
Que medidas devem ser tomadas para que as entidades empregadoras vejam estescandidatos como os restantes, que não têm epilepsia?
É fundamental promover a literacia sobre a doença junto das empresas. Quando o empregador avalia um candidato deve compreender conceitos básicos sobre epilepsia e que impacto pode ter na sua capacidade de trabalho. Muitos doentes deixam de ter crises assim que iniciam medicação. Mas o efeito na sua autoconfiança pode ser importante. A medicação raramente condiciona efeitos secundários que comprometam a capacidade laboral. A adequação do trabalho pode ser questionada, mas a organização prática do trabalho pode quase sempre ser modificada para redução de riscos, por isso a informação pessoal sobre a saúde de um empregado deve ser avaliada por alguém com habilitações para o fazer, e a capacidade para o trabalho deve ser definida pelas competências do indivíduo e não por eventuais ajustes que possam vir a ser condicionados pela doença. É ainda fundamental que seja prestada a correta assistência no local de trabalho, no contexto de ocorrência de crises, e que o empregador promova oportunidades para o tratamento médico adequado e que sejam criadas condições para formação sobre epilepsia. Só posteriormente devem ser consideradas restrições laborais e que devem ser periodicamente revistas para eventual suspensão.
SO
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