Muito mais do que uma estrutura física, a Clínica Multidisciplinar da Mama do Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil (IPO) é uma estrutura funcional, que acompanha o doente com cancro da mama desde o diagnóstico ao pós-tratamento, com um percurso muito bem definido.
“É uma grande mais-valia para os doentes serem seguidos numa estrutura com estas características, bem montada e organizada. O próprio doente reconhece isso, sente que tem um percurso muito bem definido com profissionais de todas as áreas, que sabem, muito bem, relacionar-se com os seus pares. Todos são conhecedores deste percurso, o que é um grande benefício desta estrutura funcional”, afirma Catarina Santos.
A cirurgiã conta que esta clínica, que coordena desde 2021, foi fundada, tal como se encontra atualmente, em 2008, embora, já existisse um grupo multidisciplinar organizado no sentido de tratar e acompanhar estes doentes.
A clínica é constituída por várias valências. Contudo, nem todas estão fisicamente neste espaço. Catarina Santos explica: “Na clínica propriamente dita decorrem as atividades de algumas áreas core, ou seja, as que estão envolvidas com a maioria dos doentes e que são as consultas de Cirurgia, de Oncologia e de Enfermagem.”
Além disso, neste espaço realizam-se também as consultas de grupo com as restantes áreas que participam do tratamento das pessoas com cancro da mama, como é o caso da Radiologia, Radioterapia e Anatomia Patologia.
“Depois temos também outras especialidades que se correlacionam, mas que não são ditas core, porque não estão relacionadas com a maioria dos nossos doentes, embora tenham uma forte ligação a muitos, como sejam as clínicas do Risco Genético, da Medicina Física e de Reabilitação, assim como a Psiquiatria, a Psicologia e todas as outras áreas que precisamos de ter para o tratamento completo dos doentes”, refere a cirurgiã.
Números que falam por si
A Clínica Multidisciplinar da Mama do IPO Lisboa tem recebido uma média de 1500 novos doentes por ano, um número que tem sido crescente, tendo chegado aos 1700 em 2022.
Em 2022, os profissionais desta estrutura funcional 9200 Consultas de Cirurgia; 10 500 Consultas de Oncologia (na CMM); 7700 Consultas de Enfermagem; 4300 Consultas de Decisão de Tratamento; e 1200 cirurgias. Trataram 330 doentes com quimioterapia e 530 doentes com radioterapia. Na maioria, como é de esperar, as doentes são mulheres, numa percentagem de 99% para 1% de homens.
Quando questionada acerca do pré e pós-tratamento, a coordenadora considera que os doentes chegam atempadamente à clínica e que o espaço também responde de forma célere. “Muitos dos doentes vêm fazer uma triagem inicial, pelo que são encaminhados ainda em fases precoces e atempadamente pelos colegas. A nossa disponibilidade também tem vindo, cada vez mais, a aumentar, para que que os doentes sejam tratados a tempo”, observa.
Na grande maioria, os doentes são provenientes da Medicina Geral e Familiar, seguindo-se o rastreio da Liga Portuguesa contra o Cancro. Uma percentagem mais pequena é enviada por especialistas de outras áreas do IPO ou por médicos privados.
Atualmente, o seguimento pós-tratamento agudo é feito por um período de cinco anos. Contudo, esta é uma situação que, de acordo com Catarina Santos, terá de ser revista.
“Felizmente, a sobrevivência dos doentes com cancro é cada vez maior. As pessoas ficam bem e, por essa razão, teremos de rever o tempo de seguimento, fazendo por exemplo uma ligação mais próxima com outros centros que podem fazer esta vigilância, como os centros de saúde e os próprios médicos assistentes. Estamos a receber mais doentes, o volume é crescente, pelo que temos de rever este período de seguimento”, indica a coordenadora.
Embora com assimetrias, resultados do tratamento do cancro em Portugal são positivos
Quando questionada acerca da qualidade do tratamento do cancro da mama em Portugal, Catarina Santos mostra-se satisfeita. No entanto, não deixa de lamentar as assimetrias existentes entre as diferentes zonas do país.
“Nem todos os hospitais têm todos os meios de diagnóstico e de tratamento, pelo que têm de criar estratégias para ultrapassar as dificuldades. Por outro lado, em algumas zonas, os doentes têm de fazer uma parte do tratamento num hospital e a outra parte noutro, que pode situar-se a 200 kms de distância. Isto é uma realidade e obrigatoriamente vai criar assimetrias”, observa.
E continua: “Mas, os números do registo oncológico mostram que as taxas de sobrevivência de cancro em Portugal estão ao nível da Europa ou até superiores. Mesmo com estes constrangimentos, o resultado final é positivo e isso é o que mais importa.”
Para Catarina Santos, os maiores desafios no tratamento do cancro da mama é “conseguir dar uma boa resposta aos doentes”, ou seja, ter disponibilidade para receber novos doentes e tratá-los à luz das melhores estratégias científicas.
“Isto é um grande desafio: a atualização constante. Não só nós, os profissionais, temos essa exigência pessoal, como os próprios doentes, hoje em dia, também o exigem e muito bem. As inovações são constantes. Temos de as absorver e de tomar decisões, porque não podem ser implementadas de qualquer forma. Como coordenadora, considero que esse é um dos maiores desafios”, indica.
Para terminar, a Catarina Santos afirma que os seus objetivos futuros para a Clínica Multidisciplinar da Mama são reforçar os recursos humanos em todas as áreas, médicos e enfermeiros, entre outros profissionais. “Com isto pretendemos atingir um segundo objetivo: melhorar ainda mais os tempos de resposta e a nossa qualidade.”
Texto: Sílvia Malheiro
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