Qual é a realidade da saúde sexual e reprodutiva na USF Baixa e quais são os grandes desafios enfrentados?

Temos uma população migrante de vários países, sendo a maioria do Bangladesh e do Nepal – são muçulmanos e hindus. A nível de dificuldades, muitas vezes a principal é a língua. Muitas mulheres migrantes não falam português nem inglês, portanto a comunicação é sempre através de um intermediário e não da própria mulher.

Para além disso, a falta de literacia em saúde, o desconhecimento sobre os vários métodos de contraceção no geral também são uma barreira, assim como de não poder ser um médico, homem, a prestar cuidados ginecológicos. Estas são as principais barreiras que sentimos, porque a partir do momento em que conseguimos “chegar lá”, digamos assim, não há muita resistência aos métodos contracetivos, sobretudo aos de longa duração.

“O problema é conseguirmos abordar o assunto. Normalmente, só conseguimos falar da contraceção já no pós-parto, porque não procuram ativamente uma consulta de Planeamento Familiar”.

Estamos a falar de mulheres que seguem regras muito restritas quanto à religião, que ainda estão muito sob o domínio do homem?

Essa dependência deve-se mais ao não saber falar Português ou Inglês. Na maioria das situações que vemos aqui, o homem emigra primeiro, depois traz a mulher, muitas vezes já grávida ou já com filhos. Por isso, o intermediário acaba por ser sempre o marido, que tem já algum conhecimento de inglês, e alguns de português.

Comparando com mulheres de outras nacionalidades, religiões e culturas, quais são as grandes diferenças, se é que existem?

A barreira principal é que exigem que seja uma mulher a prestar cuidados ginecológicos. Muitas vezes, com um médico do sexo masculino falam do problema, mas depois para observação pedem sempre uma mulher. Aqui na USF tentamos que as equipas sejam mistas – temos muitas enfermeiras especialistas em saúde da mulher, o que também ajuda bastante.

“Quanto ao tipo de métodos, muitas vezes há um certo desconhecimento nesta parte da contraceção, mas não acho que a religião seja aqui uma questão”.

Na comunidade muçulmana, por exemplo, preferem métodos que não sejam de longa duração. Na comunidade hindu, muitas vezes até são os homens que fazem vasectomias, que é uma coisa que até em Portugal não é muito comum.

Como profissional de saúde, considera que faz cada vez mais sentido haver formação para profissionais, para estarem a par destas diferenças culturais e religiosas?

Sim, é muito importante, tal como o acesso a mais materiais de educação para a saúde. Os nossos folhetos são os mesmos há já algum tempo e não se tem investido na tradução do consentimento informado. Mesmo no que diz respeito à linha de intérpretes, nem sempre recorremos à mesma por causa do horário e de termos consultas de apenas 20 minutos.

CG

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