Em 2021, a Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC) redefiniu os alvos-terapêuticos para o tratamento da hipertensão arterial, verificando-se algumas diferenças nos objetivos de valores da pressão arterial, sobretudo no caso da população idosa.
“As novas guidelines recomendam como meta de tratamento valores de pressão arterial inferiores a 140/90 mmHg em todas as populações, ou seja, quanto mais baixos forem os valores melhor, desde que bem tolerados”, afirma Vasco Varela, especialista de Medicina Geral e Familiar da Unidade de Saúde Familiar Descobertas, em Lisboa, e secretário geral da assembleia geral da Sociedade Portuguesa de Hipertensão (SPH).
E continua: “As indicações mudaram sobretudo no caso dos idosos, em que havia uma margem para tolerar tensões arteriais até aos 150/90 mmHg. Contudo, ao sermos menos exigentes com os valores dos idosos, estes têm maior risco de eventos cardiovasculares e é exatamente isso que pretendemos evitar quando tratamos a hipertensão.”
Segundo refere, a ESC diz que até aos 69 anos de idade “the lower is better” (quanto mais baixo melhor). No entanto, com a ressalva de que, acima dos 70 anos, os valores muito abaixo dos 140/90 mmHg podem não ser bem tolerados, havendo risco hipotensivo, sintomático, com quedas.
“Na nossa prática clínica, deparamo-nos com uma disparidade muito grande entre as próprias populações idosas, consoante as suas fragilidades. É preciso individualizar terapêuticas de acordo com as capacidades de cada doente de tolerar as tensões arteriais”, observa.
Para controlar possíveis situações de hipotensão nesta população e riscos associados, os médicos de família fazem “muita educação para a saúde”, em consultas de ensinos ao idoso, para que o doente aprenda a controlar a sua pressão arterial.
“Por exemplo, nas alturas de mais calor, devido à vasodilatação, a pressão arterial pode baixar. Ensinamos o doente a identificar essas possíveis situações e a recorrer aos nossos serviços para controlo da tensão arterial ou a fazer ele próprio a redução da terapêutica nesta altura do ano”, explica Vasco Varela.
Quando não é possível fazer este tipo de ensinos ao idoso, os profissionais de saúde recorrem aos cuidadores que os acompanham à consulta. Além disso, deixam também as indicações por escrito, para que não haja dúvidas.
Ao ser questionado acerca das dificuldades no seguimento próximo destes doentes, dado o elevado volume de trabalho e as listas de espera para Medicina Geral a Familiar, Vasco Varela responde, dando a conhecer a realidade da unidade onde trabalha: “Na USF Descobertas temos sempre consultas abertas e damos resposta com grande capacidade na grande maioria dos dias. Não deixamos ninguém ficar sem ser avaliado. Para alguns casos temos também as teleconsultas e os doentes e/ou cuidadores têm também o email do médico, para que possam esclarecer pequenas dúvidas.”
Dito isto, Vasco Varela refere que, apesar das fragilidades dos idosos e da necessidade de os acompanhar mais frequentemente, a população mais problemática é o grupo com idades compreendidas entre os 40 e os 50 anos. “A hipertensão arterial é assintomática, os doentes dizem que se sentem bem e, muitas vezes, a adesão à terapêutica não é eficaz. Não há dados que o confirmem, mas, empiricamente, eu diria esta é a população em que é mais difícil fazer o controlo”, indica.
Para terminar, Vasco Varela deixa duas mensagens. Uma para os doentes: “Devem consultar o seu médico assistente.” Outra para os médicos: “Devem fazer uma medição correta e adequada da pressão arterial do doente, num ambiente calmo. Não desvalorizar e prescrever toda a medicação necessária para manter os valores da pressão arterial controlados. Em casos de hipertensões resistentes, é feita uma referenciação para consultas específicas.”
Texto: Sílvia Malheiro
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