Recentemente, a morte de figuras públicas por suicídio trouxe novamente à tona a importância de debater abertamente as questões relacionadas com a saúde mental e destacar a necessidade de procurar psicoterapia, como forma de apoio.

Carolina Ferreira, psicóloga clínica, refere que ao contrário daquilo que pensamos, um sinal de profunda tristeza pode ser um bonito sorriso. As figuras públicas estão erradamente associadas a felicidade, pertença e valor próprio o que é completamente distinto de fama e aparente sucesso. Fazendo crescer a ideia de “como fez isto, se tinha tudo?”

O que é isto de “ter tudo”? A minha concepção de “tudo” poderá ser diferente da de quem me rodeia. Sendo difícil compreendermos o que o outro pensa, sente e faz. E aí devemos nos centrar no conceito de bem-estar, em que cada indivíduo percebe o seu próprio potencial, lida com as adversidades e é capaz de dar um contributo para a sua comunidade.

No entanto, quando vivemos perdas sucessivas, nos sentimos um fracasso, sobrecarregados por problemas económicos ou familiares, ou mesmo sem sabermos bem porquê, podemos ficar presos na nossa dor e acreditar que não existem soluções para os nossos problemas, não conseguindo percepcionar este bem-estar. Sentimo-nos impotentes para mudar a nossa vida e a ideia de morrer, de suicídio, dá-nos a ilusão de algum conforto e controlo sobre a situação.

Muitas vezes fala-se de suicídio com uma certa leveza, criando um debate que gira em torno de dois “pólos”, o da cobardia e o da coragem. Ambos inexistentes nesta situação, onde apenas está presente um sofrimento profundo.

Os pensamentos e sentimentos suicidas podem ser aterrorizantes. Quando já não conseguimos ver nenhum propósito ou sentido em continuarmos a viver, os nossos sentimentos podem parecer insuportáveis. Podemos odiar-nos e acreditar que somos inúteis, que não fazemos falta a ninguém e que ninguém gosta e se importa realmente connosco. Podemos sentir raiva, vergonha e culpa. Muitas vezes isolamo-nos dos outros e é difícil partilhar com a família e os amigos o quão mal nos sentimos. Às vezes nem para nós próprios é assim tão claro que queremos morrer. Podemos sentir-nos indiferentes, confusos ou ter a esperança que alguém nos compreende e nos ajude. Muitas pessoas experienciam vontade de se suicidar e pensamentos suicidas como parte de um problema de saúde psicológica ou quando experienciam problemas de saúde física graves e dolorosos.

O suicídio pode ser resultado de uma combinação de fatores, incluindo desordens não tratadas, como depressão, entre outras, eventos traumáticos, isolamento social, problemas financeiros, experiência de perda, abuso de drogas e álcool, relacionamentos conturbados e falta de apoio emocional. É crucial compreender que o suicídio é resultado de vivência de uma profunda dor e desespero.

Os psicoterapeutas conseguem oferecer um ambiente seguro e confidencial para falar de questões pessoais, explorar emoções e desenvolver estratégias. A terapia oferece suporte emocional, ajuda na identificação de padrões de pensamento negativos e fornece ferramentas para promover a resiliência.

Devemos progredir para uma sociedade que valorize e promova abertamente a saúde mental, onde as pessoas se sintam confortáveis em procurar ajuda sem estigma. Isso pode envolver estar atento aos sinais de alerta, como mudanças de comportamento, isolamento social, expressões de desesperança ou declarações de pensamentos suicidas, e encorajar a procura de ajuda profissional.

Os números do suicídio alertar-nos que a saúde mental não deve ser negligenciada nem estigmatizada. Todos nós, independentemente de nossa posição na sociedade, podemos enfrentar desafios emocionais e precisamos de apoio.

Mas então que sinais devemos estar atentos?
Experiências de pensamentos e sentimentos suicidas variam de pessoa para pessoa.

  • Podemos sentir-nos assustados, confusos, esmagados, sem controlo ou incapazes de lidar com estes pensamentos.
  • Sentir desespero, falta de esperança e dificuldade em encontrar sentido na vida.
  • A dor e o sofrimento parecem intermináveis, acreditando que a situação não vai melhorar
  • Mesmo com família e amigos, podemos sentir-nos sozinhos, excluídos, indesejados ou rejeitados.
  • Sentimentos de inutilidade, fracasso ou ser um “fardo” para os outros.
  • Fascínio pela ideia de morrer e pelo alívio que acredita que isso trará, acompanhado por sentimentos de vergonha, culpa e egoísmo.
  • Desejo de não continuar a viver da forma como está a experienciá-la, acreditando que não há outra escolha.
  • Esses pensamentos podem ser constantes ou pontuais.

O suicídio nunca é a solução! É possível tratar e recuperar. Com a ajuda certa, é possível recuperar desse estado de desesperança e voltar a encontrar vontade de viver.

Carolina Ferreira, psicóloga clínica, reforça a importância de todos nós como comunidade fortalecermos o nosso músculo da empatia, tendo a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. Não é suficiente debatermos saúde mental apenas em situações de suicídio. Precisamos de normalizar a ida à psicoterapia e genuinamente estarmos atentos às emoções, um dos outros.

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