“A FSNS entendeu desenvolver, ao longo de mais de 12 meses, um debate aprofundado sobre o que se passa no SNS, sobre o que é preciso mudar, na medida em que se não mudarmos ficamos paralisados, e aquilo que fica paralisado não existe”, começou por afirmar a presidente durante a sessão de boas-vindas que decorreu na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL).

Maria de Belém Roseira referiu que a FSNS “não se conforma” com o facto de que “na área de intervenção que mais beneficia do conhecimento, continuamos com regras e condicionamentos que são completamente inaceitáveis”. “Nada impede que, quer os processos, quer os instrumentos que temos à nossa disposição, não acompanhem todo o outro movimento que se passa relativamente ao aperfeiçoamento do conhecimento científico, e portanto optámos por olhar para o SNS de modo a ver e analisar a profundidade da ferida, não para criticar nem encontrar culpados, mas para apontar aquilo que deve ser alterado”. “Pretendemos fazer uma prestação de contas com propostas concretas e documentadas”, rematou a presidente no fim da sua intervenção.

A responsável da FSNS cedeu depois a palavra a João Eurico Fonseca, diretor da FMUL, que começou por referir que “o Serviço Nacional de Saúde (SNS) é um motivo de orgulho para os profissionais de saúde” e “podendo alargar o conceito, certamente muitos portugueses terão orgulho no SNS”. “Podemos ainda dar outro passo dizendo que os mesmos profissionais que têm orgulho no SNS têm uma enorme preocupação e um estado de ansiedade e de frustração em relação ao SNS. Existe esta dualidade, e provavelmente os portugueses terão o mesmo pensamento”, apontou.

João Eurico Fonseca assumiu que estamos perante “uma equação complexa com fatores que jogam dentro da saúde global e que vão para além daquilo que é a nossa realidade nacional”. No que diz respeito ao aumento dos custos de saúde, o diretor da FMUL afirmou que estes se refletiram de forma global, “internacionalmente, e isso é um peso para todas as estruturas sociais de todos os países, sendo que os serviços de saúde ainda mais dificuldades têm de fazer face a isso mesmo”.

Por outro lado, o também membro da direção do Centro Académico de Medicina de Lisboa, referiu ainda que a realidade deste e de outros centros académicos traduzem “hospitais de alta complexidade, ensino para grandes números de alunos de Medicina” e consequente “treino pós-graduado”, para além da “atividade de investigação, clínica e translacional à volta desta complexidade”.

Ou seja, “na prática, isto significa que estes centros académicos clínicos, e particularmente as unidades de saúde a eles associadas, têm ao seu encargo doentes com mais complexidade e/ou raros”. De acordo com João Eurico Fonseca, estes doentes traduzem um “muito maior esforço por parte dos profissionais de saúde por cada doente visto”, para além do custo acrescido, uma vez que “estes doentes custam muito mais”. “Por um lado, há uma sensação de incapacidade financeira crónica e desajustada em relação ao que é a realidade do SNS porque estes centros vão sempre ser mais onerosos, mas temos também profissionais de saúde que estão muito mais sobrecarregados pela complexidade e ou raridade dos casos, ao mesmo tempo que os outcomes desse mesmo sucesso do trabalho dos profissionais de saúde não é medido pela complexidade”.

Para o dirigente da FMUL, todos estes pontos apresentados representam “mais sobrecarga, mais stress, mais multitasking” para os profissionais que integram estes centros, sendo que “o desenvolvimento científico é feito sobre tudo isto”. “Não há, neste momento, um racional que possa proteger de forma adequada os profissionais de saúde de forma a que sejam recompensados do ponto de vista de carreira e remuneratório sobre aquilo em que fazem a diferença, que se traduz na qualidade dos tratamentos de doentes complexos, de dar educação e de contribuir para a investigação. Enquanto não resolvermos isso vamos ter muita dificuldade em fixar profissionais no SNS“.

Adicionalmente, João Eurico Fonseca apontou que “ao pensarmos nesta lógica complexa, temos também a realidade de que, de uma forma proativa ou não, aceitámos a instalação da medicina privada em Portugal, de forma progressiva, que compete ativamente com a emigração pelos profissionais de saúde”. E acrescentou: “se não soubermos colocar uma mais-valia laboral para estes profissionais no SNS “.

CG

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