O estudo passa por entrevistar doentes, familiares e outras pessoas relevantes, de modo a compreender quais as preferências em Portugal e em que medida estão a ser cumpridas. Com este trabalho, as investigadoras pretendem identificar os principais fatores que influenciam as escolhas, tais como fatores relacionados com a doença, o ambiente em que as pessoas vivem ou as motivações pessoais. Porém, acima de tudo querem identificar se as preferências das pessoas são ou não cumpridas.

Os participantes do estudo são doentes seguidos pelas equipas de cuidados paliativos (pediátrica e de adultos) do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e respetivos familiares. O estudo está também a ser conduzido nos Estados Unidos da América, Países Baixos e Uganda.

Bárbara Gomes, líder do projeto e investigadora coordenadora da Faculdade de Medicina da UC (FMUC) e do Centro de Inovação em Biomedicina e Biotecnologia (CIBB), afirma que “esta investigação pioneira em Portugal vai permitir uma compreensão mais aprofundada das escolhas no fim de vida, contribuindo para perceber como são cumpridas as vontades individuais e de que forma é possível melhorar o acompanhamento dos doentes e das famílias”. E acrescenta: “este levantamento será crucial para colmatar lacunas e melhorar as estratégias de cuidados paliativos em linha com as preferências dos doentes e das suas famílias”.

A investigação encontra-se a ser desenvolvida no âmbito do projeto “EOLinPLACE – Choice of where we die: a classification reform to discern diversity in individual end of life pathways, liderado por Bárbara Gomes, financiado com 1,8 milhões de euros pelo Conselho Europeu de Investigação.

A equipa do EOLinPLACE já reviu tudo o que se sabe no mundo sobre preferências para locais de cuidados em fim de vida e de morte através de artigos científicos. Nesse sentido, foram identificados 309 estudos publicados nos últimos 50 anos, realizados com mais de 110 mil doentes (adultos e crianças) e mais de 30 mil membros das suas famílias, na Europa, América do Norte, Ásia, América Latina, África e Oceânia. Os resultados estão agora publicados no Journal of Pain and Symptom Management.

Nesta fase do estudo foi possível identificar “fatores associados a uma maior ou menor congruência entre as preferências das pessoas e a realidade do seu local de morte, tendo sido possível perceber, por exemplo, que pessoas com doenças não malignas e de baixo nível social tiveram menor oportunidade de ver as suas preferências cumpridas ou respeitadas”, destaca Sara Pinto, membro da equipa do EOLinPLACE e primeira autora desta revisão. “Identificar com precisão essas preferências traduz-se numa oportunidade muito importante para mudar as suas vidas de forma positiva”, acrescenta.

O domicílio/casa foi o local mais escolhido pelos doentes e também pelos familiares. Hospitais e unidades de cuidados paliativos foram locais preferidos por minorias substanciais. Embora se saiba ainda pouco sobre se as preferências mudam à medida que a doença avança, é possível que tal aconteça para alguns doentes e familiares.

Este trabalho de revisão revela ainda que as escolhas das pessoas foram influenciadas por três principais fatores: pela doença que as afeta; pelas motivações individuais (como a dignidade, a autonomia ou uma morte tranquila); e fatores ambientais (como a rede de suporte familiar, o conforto, ou o acesso a medicação). “Os doentes e familiares enfrentam diversas dificuldades nos cuidados em fim de vida em casa. As razões são preocupantes, com doentes e familiares a apontarem dificuldades de acesso a medicamentos essenciais, falta de equipamentos e apoio em momentos críticos, para além da sobrecarga dos cuidadores”, explica Sara Pinto.

“O conhecimento sobre a vontade das pessoas e a forma como é ou não respeitada é absolutamente crucial e requer uma análise aprofundada para que seja possível implementar mais e melhores estratégias de cuidados paliativos. Honrar as preferências das pessoas, independentemente da sua condição de saúde e estatuto social ou económico, é um aspeto crítico para assegurarmos a prestação de cuidados de alta qualidade no fim de vida a todos, diminuindo o sofrimento dos doentes e da sua rede familiar”, elucida Bárbara Gomes.

As investigadoras sublinham ainda que estes estudos pretendem chamar a atenção para a importância de “as pessoas com necessidades de cuidados paliativos pensarem e expressarem as suas preferências, de colocar os profissionais de saúde a discuti-las com as famílias, e, em conjunto, encontrarem formas de assegurar que mais pessoas vêem o seu desejo cumprido”.

CG/COMUNICADO

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