O modelo educacional clássico tem sido dominante durante largas décadas. A sua lógica passa por uma estrutura hierarquizada, a qual permite uma experiência de aprendizagem sequencial e progressiva, com os alunos a avançar com base na sua idade e no seu desempenho académico. Em Portugal, começamos no Pré-Escolar, de frequência opcional, e que está preparado para receber crianças entre os 3 e os 6 anos de idade. Segue-se o Ensino Básico, que compreende três ciclos sequenciais e ocupa os mais novos entre os 6 e os 15 anos. É, tipicamente, de via única, o que significa que, em geral, todos os alunos são expostos aos mesmos conteúdos. Segue-se o ensino secundário, que está organizado em três anos (i.e., do 10.º ao 12.º ano), permitindo formações e aprendizagens diversificadas e que potenciam o ingresso no ensino superior e/ou a inserção do graduado no mercado de trabalho. É de referir que, no nosso País, o ensino básico é universal e gratuito, sendo que os jovens até aos 18 anos de idade são, também, obrigados a frequentar o ensino secundário.

Esta forma de organização tem a vantagem de fornecer uma experiência educacional consistente e organizada, a qual que garante uma certa homogeneidade de conhecimento no seio da população portuguesa, aspeto que reputo de interessante e necessário. Infelizmente, esta abordagem tem, também, várias limitações. Imagine que entra, aleatoriamente, numa sala de aula em solo nacional. O mais provável é encontrar um grupo de alunos de idades relativamente próximas, os quais se sentam em carteiras organizadas por filas viradas para o quadro, onde está o Professor. Este tem a responsabilidade de gerir o dia-a-dia da sala de aula, sendo também chamado a avaliar o desempenho dos seus alunos. O programa que está a ser cumprido foi, quase de certeza, prescrito centralmente pelo ministério da educação, que divide o conhecimento em disciplinas estanque, como a matemática, a biologia ou o português. Por outro lado, com grande probabilidade, a instrução é unidirecional, i.e., na maioria das sessões o professor partilha a informação que considera relevante, enquanto os alunos estão preocupados em completar tarefas que lhes permitem lidar com testes individuais mais ou menos padronizados. Na esmagadora dos casos, os testes privilegiam a memorização e a aquisição de conhecimento factual já que, salvo honrosas exceções, o pensamento crítico, a criatividade e capacidade para resolver problemas não são o foco principal.

Como economista, diria que o importante é perceber se os benefícios do sistema ultrapassam as suas limitações. Os números disponíveis parecem sugerir que sim. Em particular, a publicação "Educação em Números 2023", da responsabilidade da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, mostra que, no ano letivo 2021/2022 (último para o qual há informação disponível), existiam 397 100 alunos inscritos no Ensino Secundário em Portugal, valor que compara com os 347 400 de 2005/2006. Os valores para 2021/2022 geram uma taxa real de escolaridade de 88% e uma taxa de retenção de 8.6%. Dito de outra forma: o sistema capta atualmente 88 em cada 100 jovens em idade normal de frequentar o Ensino Secundário, sendo que em cada 100 jovens que frequentam este nível apenas 9 não conseguem avançar no final do ano letivo. Estas taxas sugerem um verdadeiro milagre português. De facto, em 2005/2006, o País apresentava uma taxa real de escolaridade de 54.5% e uma taxa de retenção de 31%. Conclusão: estamos a mobilizar uma percentagem muito mais elevada de jovens para o Ensino Secundário e, uma vez no sistema, estes lidam cada vez melhor com os desafios que lhe são colocados.

Infelizmente, a realidade parece não ser esta. De facto, são várias as vozes que, ao longo dos anos e com conhecimento de causa, vêm chamando a atenção para o facilitismo galopante que grassa no sistema português. Este é cada vez menos exigente e infantilizado, desprovido de conteúdos relevantes, desresponsabilizando cada vez mais os alunos. Ao mesmo tempo, sucessivos governos reduziram a profissão docente a quase nada. Estas mesmas vozes colocam o dedo na ferida, denunciando um sistema onde pontifica a desmotivação, o desinteresse, a apatia e a total desvalorização do conhecimento e do esforço individual que está implícito no ato de aprendizagem.

Diria, pois, que a necessidade de adotar uma nova visão para a educação em Portugal é evidente. De facto, é crucial resolver rapidamente os problemas do sistema, acautelando ao mesmo tempo um conjunto de novas realidades que vão, seguramente, gerar desafios importantes. Veja-se o caso da integração da tecnologia no processo ensino-aprendizagem, algo que está longe de ser consensual. Por outro lado, são vários os países e propostas de ensino que apostam, cada vez mais, numa aprendizagem personalizada. Some-se a crescente ênfase no desenvolvimento de competências em detrimento do conteúdo, matéria à qual sou particularmente sensível. De facto, parece-me que, no século XXI, as nações que terão sucesso são as que vierem a conseguir desenvolver nos seus cidadãos um verdadeiro pensamento crítico, que seja capaz de ser utilizado para a resolução de problemas multifacetados e cada vez mais complexos. Neste contexto, compete à educação formal fomentar a inovação e a criatividade, assentes na capacidade de colaboração e comunicação. Esta abordagem permitirá que os futuros trabalhadores continuem a sua formação ao longo da vida ativa, sendo por isso mais capazes de aplicar o conhecimento teórico ao mundo real, algo que é particularmente relevante nas áreas-chave do nosso futuro coletivo como é o caso das Ciências, da Tecnologia, da Engenharia e da Matemática.

Tudo isto acontece ao mesmo tempo que se exige que a educação formal ajude a construir cidadãos de pleno direito. Assim, a escola tem de passar e consolidar valores fundamentais como o respeito pelo próximo e pela lei, a tolerância e o primado da responsabilidade individual e do mérito. O sistema de ensino também tem de garantir que os mais jovens conseguem inserir-se na sociedade onde vivem, capacitando-os com conhecimentos de finanças pessoais, organização do sector público, noções básicas de saúde, de prática desportiva e nutrição. Por fim, a educação do século XXI não pode abdicar da essência da cultura portuguesa colocando, ainda assim, o tema da sustentabilidade ambiental no epicentro das preocupações dos mais novos. Seremos nós capazes de responder a tamanho desafio?

NOTA: Este artigo apenas expressa a opinião do seu autor, não representando a posição das entidades com as quais colabora.