Todos os verões, assistimos às notícias a propósito da escassez de alojamento para os estudantes do ensino superior. Esta situação, que afeta diretamente milhares de jovens deslocados da sua residência e, claro, as suas famílias, é mais do que um problema logístico: é um dos muitos reflexos da grave crise  a habitação que enfrentamos em Portugal.

As estatísticas são claras e devem preocupar-nos: faltam 75 mil camas para estudantes, com uma oferta de quartos insuficiente e cada vez mais inacessível. O Observatório do Alojamento Estudantil tem publicado regularmente dados que ilustram o agravamento desta situação. Embora existam planos ambiciosos e bem-vindos para disponibilizar mais 18 mil camas até 2026, este esforço é manifestamente insuficiente. Afinal, a falta de alojamento para estudantes não é apenas uma questão de infraestrutura e tem implicações sociais e económicas profundas. A ausência de oferta obriga muitos estudantes a recorrerem a soluções precárias ou a optarem por percursos diários longos. Infelizmente, para um número crescente de alunos, a impossibilidade de encontrar alojamento adequado é um fator que dificulta o acesso ao ensino superior, perpetuando desigualdades sociais e limitando o acesso à educação.

Este desafio está intimamente ligado à crise setorial que afeta o nosso país, com a agravante de ser transversal a todas as cidades com grandes polos universitários, como Lisboa, Porto, Faro, Coimbra, Braga, Guimarães e Aveiro, por exemplo. Com a oferta a não conseguir acompanhar a procura, o aumento dos preços dos imóveis e a escassez de arrendamento, todos os envolvidos - estudantes, famílias, promotores imobiliários e instituições públicas - enfrentam um cenário extremamente complexo.

Precisamos de uma resposta abrangente e coordenada, e parece-me que aqui o Plano de Recuperação e Resiliência pode ser uma oportunidade única que nos permita canalizar recursos significativos para o desenvolvimento de alojamento para estudantes. Para além do investimento direto em novas construções, julgo que é fundamental fomentar parcerias público-privadas que possam alavancar o capital privado para ampliar a oferta. A criação de hubs para estudantes, com acesso a serviços e transporte público pode aliviar a pressão sobre o mercado imobiliário local e oferecer melhor qualidade de vida aos jovens.

De facto, a crise do alojamento estudantil é mais um dos reflexos da crise habitacional mais ampla em Portugal. Garantir que o acesso à educação não seja condicionado pela falta de habitação é uma obrigação moral. Afinal, quem casa quer casa, mas quem estuda precisa dela também. É um imperativo que todos - governo, setor privado e sociedade civil - colaboremos para enfrentar este desafio.

Diretor-geral da GesConsult