Os fabricantes de automóveis europeus continuam a forte aposta nos veículos a combustão, apesar da pressão para a transição para os carros elétricos parecer vir de todas as frentes, tanto pela proibição da UE para a venda de novos veículos com motores de combustão a partir de 2035, como pela crescente pressão de gigantes que começam a ganhar espaço no mercado, como é o caso dos fabricantes chineses.
A crescente preocupação com as emissões poluentes e com a pegada carbónica, bem como as metas europeias e nacionais que pretendem uma transição rápida para os veículos elétricos, não invalida que os carros a combustão ainda desempenhem um papel significativo na mobilidade atual.
Aos dias de hoje, sabemos que é incerto dizer que o futuro do setor automóvel é elétrico, mas talvez não seja, num futuro próximo.
Além da competitividade forte em relação aos fabricantes chineses, que estão já muito evoluídos em termos tecnológicos e que começam a posicionar-se na Europa, as vantagens significativas que os veículos a combustão apresentam para quem os utiliza, representam, por si só, um entrave a esta transição acelerada que se pretende que aconteça. Ora vejamos. Em termos de custo, os veículos a combustão continuam a exigir um investimento financeiro menor, sendo mais acessíveis que os elétricos, o que se torna ainda mais relevante na atual conjuntura atual; em termos de infraestrutura, existe no país uma ampla rede de postos de combustíveis já instalada, em contraste com a fraca oferta de postos de carregamento elétrico no território; e, ainda, estes carros permitem uma maior autonomia de condução, o que faz, e fará, com que continuem a ser a opção preferencial no momento de escolher um carro novo.
Por outro lado, com as metas de descarbonização em vigor e a escalada das marcas de veículos elétricos chinesas, o destino de marcas de referência nos motores de combustão, poderá ser incerto. Temos o mais recente exemplo da Volkswagen, que em setembro anunciou que está a ponderar o encerramento de fábricas na Alemanha, pela primeira vez nos seus quase 90 anos de existência, para reduzir custos e conseguir responder às exigências da transição para a mobilidade elétrica. No mesmo mês, vimos anunciada a chegada a Portugal da marca chinesa Xpeng, que quer ter seis pontos de venda até ao final deste ano. É importante termos consciência de que, apesar de os elétricos demorarem o seu tempo a preencher o mercado de forma significativa, terão sempre de concorrer com um enorme leque de opções e alternativas, seja nos motores a combustão, híbridos, ou outras alternativas a surgir com o contínuo desenvolvimento nos combustíveis sintéticos e os motores cada vez mais eficientes.
O segmento de mercado chinês está muito bem preparado para atacar os próximos anos, nesta nova realidade e adaptação que exigirá aos concorrentes europeus e demais, abreviar caminho. Uma das alternativas a mais curto prazo está a ser a união de marcas já existentes no mercado com estes verdadeiros ‘gurus’ chineses, que lhes garantam a sustentabilidade a nível eletrónico, como é exemplo o acordo feito em 2024 entre a Salvador Caetano Auto com o grupo chinês BYD, para a importação e distribuição de veículos 100% elétricos em Portugal. E muitos outros se seguem.
Há uns anos, fabricar carros impunha outra complexidade na capacidade de produção, nomeadamente nos motores, estando o setor circunscrito aos fabricantes com aptidão e recursos para produzir motores. Hoje, e no futuro, o fabricante de automóveis com mais sucesso será aquele que mais desenvolvimento tecnológico tiver à sua disposição. Em jeito de metáfora, poderemos imaginar que no futuro, os carros serão um “computador com quatro rodas”. O que fica patente quando percebemos que, além dos fabricantes de automóveis, outros fabricantes tecnológicos se viram para este setor, como é exemplo da empresa Xiaomi, que também já está a fabricar automóveis.
Apesar do panorama, não se prevê que a entrada de mais carros elétricos e novos construtores tenha, para já, um efeito direto no aumento de preços para o consumidor, até pelo simples facto de que o consumidor continuará a ter à sua disposição várias alternativas em viaturas movidos a combustível, em alguns casos mais ajustadas às necessidades. Contudo, à medida que os carros começam a ser mais tecnológicos, começarão a surgir mais marcas, o mercado ficará gradualmente mais competitivo, e com preços também mais atrativos. Sabemos que se existissem mais incentivos na Europa e consequentemente em Portugal, o mercado dos veículos elétricos seria mais atrativo, mas até lá, cabe aos fabricantes de automóveis que ainda não deram esse passo ajustarem-se rapidamente à forte concorrência trazida pelos países do Oriente, sob pena de ficarem para trás e colocarem até em risco a sua existência futura.
Luís Rosa, coordenador nacional da DS Auto