Mais uma cimeira luso-espanhola chegou ao fim, e com ela, mais um arrastar de promessas sem apeadeiro. Quem esperava um novo impulso para a ferrovia entre Portugal e Espanha, em particular no eixo Lisboa-Madrid, ficou mais uma vez desiludido. Do lado espanhol, regista-se mais uma promessa de conclusão da linha de alta velocidade até Badajoz em 2030, enquanto Portugal se compromete a terminar as ligações Évora-Elvas e Porto-Vigo até 2032. Quanto ao trajeto Lisboa-Madrid, esse chuta-se para canto, talvez lá para 2034.
Dos três países que coorganizarão o Mundial de Futebol de 2030, Portugal é o mais atrasado em termos ferroviários e isso tem um custo: Espanha tem já a maior rede de alta-velocidade da Europa e a segunda maior do mundo; Marrocos inaugurou a sua linha Casablanca-Tânger em 2018 e prevê construir uma extensão até Marraquexe antes de 2030. Só mesmo no nosso país é que continuamos a ver passar os comboios – aliás, para percorrer a distância entre Lisboa e Madrid são necessários três, com dois transbordos e quase 10 horas de viagem.
Continuamos encurralados num Portugal que parece incapaz de avançar com os tempos e que insiste em adiar o futuro com soluções do passado. Este atraso ferroviário é muito emblemático do isolamento do país face ao resto da Europa, em particular na relação com Espanha. A tão aguardada ligação de alta velocidade entre Madrid e Lisboa, projetada inicialmente para 1994, tem sido constantemente adiada, refletindo uma lacuna histórica e política. Em vez de unir as capitais ibéricas, os sucessivos governos de ambos os lados da fronteira têm oferecido desculpas e soluções provisórias, o que tem um impacto muito negativo não só na mobilidade dos cidadãos, mas também nos setores empresariais e turísticos, comprometendo o desenvolvimento desta parte da Península Ibérica.
No caso português, o paradoxo é ainda maior: ao mesmo tempo que nos promovemos como um destino turístico de excelência e como um parceiro europeu, fazemos tudo para nos mantermos desconectados dos nossos vizinhos mais próximos. Em consequência disso, a rota Lisboa-Madrid é das ligações aéreas europeias com maior número de voos e é também esta falta de conectividade terrestre que nos descarrila para um isolamento autoinfligido e para a necessidade artificial de um novo aeroporto que sirva a capital.
É inadmissível que, num momento em que a mobilidade sustentável é uma prioridade em todo o mundo, Portugal e Espanha, dois países europeus, continuem a protelar um projeto vital para a sua integração e competitividade.
O Mundial de 2030 será, sem dúvida, um espetáculo à escala planetária. Nessa altura, a comparação da mobilidade entre os vários estádios dos três países anfitriões saltará à vista de todos: organizadores, participantes, jornalistas, turistas e equipas, todos eles perceberão a nossa falência política e visionária. Sobra-nos apenas a esperança de que o futebol resolva tudo e que a FIFA dê um pontapé de coragem: sem alta velocidade entre as duas capitais, Portugal fica fora de jogo… e fora da organização do certame. É que desta vez, os mouros somos mesmos nós!
Docente em Sistemas de Transporte e consultor em aviação, aeroportos e turismo