Portugal tem apresentado dados preocupantes relativamente à prevalência de Diabetes Mellitus, conforme apontam os recentes dados divulgados pela Federação Internacional da Diabetes. O país regista a segunda maior prevalência padronizada de diabetes da União Europeia, com uma taxa de 9,1% na população entre 20 e 79 anos, superando a média de 6,2% dos 27 países membros.

Simultaneamente, à medida que aumenta a preocupação com o impacto da inflação, surge, entre outras questões, uma relevante: poderá a implementação da medida IVA zero no cabaz alimentar ser uma ferramenta capaz de auxiliar a gestão da diabetes?

Para melhor compreendermos o alcance da iniciativa IVA zero, é importante explorar os critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde que fundamentaram a seleção dos 46 produtos alimentares que compõem o cabaz.

Cada um dos sete grupos da Roda dos Alimentos apresenta funções e características nutricionais específicas, o que justifica a presença de todos eles no cabaz com IVA zero. Essa inclusão é de suma importância para garantir uma alimentação diária completa e equilibrada.

Os cereais e derivados, incluindo os tubérculos, compõem a maior fração da Roda dos Alimentos. Alimentos como pão, batata, arroz e massas alimentícias estão contemplados no cabaz com IVA zero por serem os principais fornecedores de energia, fibra e outros nutrientes. Quanto menos refinados, melhor, uma vez que assim preservam os seus nutrientes em maior quantidade.

O consumo de hortícolas crus e/ou cozinhados é a base de uma alimentação saudável, devido à sua interessante densidade nutricional com compostos antioxidantes, vitaminas, fibra e minerais. A variedade do consumo é importante, uma vez que diferentes cores indicam também diferentes benefícios. A sopa, essencial e tão presente na tradição alimentar portuguesa, não deve ser esquecida já que permite conservar grande parte das propriedades nutricionais dos alimentos. O consumo de sopa nas duas refeições principais pode ser uma estratégia para alcançar as recomendações diárias de consumo de hortícolas. Os hortícolas que fazem parte do cabaz IVA zero são a cebola, o tomate, a couve-flor, a alface, os brócolos, a cenoura, a courgette, o alho-francês, a abóbora, os grelos, a couve-portuguesa, os espinafres, o nabo.

A fruta, tal como os hortícolas, é um fornecedor insubstituível de minerais, vitaminas e fibra e por isso o seu consumo deve ser diário, aplicando-se também neste caso a lógica da variedade das cores. A maçã, banana, laranja, pera e melão estão contemplados na medida IVA zero.

O grupo da carne, pescado e ovos é fornecedor de proteína de elevada qualidade e, simultaneamente, fonte de ferro, zinco e vitaminas do complexo B. Variar o consumo de alimentos deste grupo, em quantidades adequadas, integra os princípios de uma alimentação saudável. É aconselhável consumir mais pescado e menos carne (principalmente vermelha), sendo os ovos uma boa alternativa para ambos. Carne fresca ou congelada de frango, peru, porco ou vaca fazem parte deste cabaz.

As leguminosas em sopa ou no prato devem ser consumidas diariamente, uma vez que possuem uma elevada qualidade nutricional e são uma ótima fonte de proteína vegetal. Estão presentes no cabaz, na versão seca, o feijão vermelho, o feijão-frade, as ervilhas e o grão-de-bico.

Os laticínios, nomeadamente, queijo, leite e iogurte, são por excelência os fornecedores de cálcio, proteína e vitaminas do complexo B. É importante saber fazer escolhas saudáveis e preferir produtos com menor teor de açúcar, gordura e sal adicionados, o que exige uma atenção específica à informação que consta nos rótulos e ao semáforo nutricional. O cabaz contempla leite de vaca, iogurtes ou leites fermentados e queijos.

As gorduras e óleos, nomeadamente o azeite, óleos vegetais e manteiga também fazem parte desta medida. É um grupo que se mostra essencial para o bom funcionamento do organismo, preferencialmente as gorduras de boa qualidade e, obviamente, desde que sejam consumidas com moderação.

Com isto, torna-se claro que a escolha dos alimentos não foi aleatória, demonstrando o alinhamento desta medida tributária com os princípios de uma alimentação saudável. No entanto, ainda podem surgir dúvidas quanto à adequação do cabaz de alimentos com IVA zero na alimentação de pessoas com diabetes.

Em primeiro lugar, é essencial salientar que ter diabetes não é sinónimo de um plano alimentar completamente distinto, mas sim focar em escolhas alimentares saudáveis e equilibradas, adaptadas às necessidades individuais, assim como qualquer outra pessoa que não tem diabetes.

Posto isto, ao analisarmos minuciosamente a lista de alimentos presentes no cabaz, é possível perceber que alguns deles ainda podem suscitar algum receio em pessoas com diabetes, devido a mitos enraizados, tais como a batata, arroz, massa, pão, banana, melão, cenoura e outros. No entanto, estes alimentos podem e devem ser incorporados de forma consciente e equilibrada na alimentação, quando não existem outras contraindicações. Neste caso, a chave para o equilíbrio está na quantidade consumida, tornando importante a orientação de um profissional na área de nutrição.

Assim, será possível não só desfrutar de uma alimentação mais diversificada e prazerosa, mas também assegurar uma maior variedade de nutrientes essenciais para a saúde, inclusive para o auxílio do controlo da Diabetes e redução do risco de complicações associadas à doença (fibra, magnésio, selénio, crómio, vitamina D, entre outros).

Atualmente, três meses após a implementação do IVA zero, o preço total estimado do cabaz alimentar ronda os 129€, representando uma redução de quase 10€ em relação ao período inicial da medida, conforme indicam dados recentes da DECO.

Ao retrocedermos até 2017, percebemos que foi igualmente implementada uma medida tributária, desta vez com foco na alimentação, a qual consistia na aplicação de um imposto especial sobre bebidas adicionadas de açúcar ou edulcorantes. Através de relatórios governamentais, foi possível verificar que essa medida acarretou certas mudanças, como a redução de cerca de 15% nas vendas das bebidas abrangidas pelo imposto no período de 2017 a 2020, e a própria indústria alimentar sofreu alterações, reduzindo o teor de açúcar nas bebidas em 17% entre 2016 e 2020.

Apesar de não ser o ser o seu objetivo principal, será que a medida IVA zero no cabaz de alimentos, se implementada por tempo suficiente que permita observação de resultados, pode exercer uma influência positiva na qualidade dos hábitos alimentares dos portugueses? Assim esperamos.

Referências Bibliográficas:

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