A interação entre os setores público e social é antiga, mas ainda há várias arestas a limar. Para Manuel Lemos, o principal problema a ser resolvido, atualmente, é a Rede Nacional de Cuidados Continuados e Integrados (RNCCI). “Em 2006, quando se criou a RNCCI, alertava-se para a necessidade de serem necessárias 15 mil camas em 2016. Estamos em 2023 e ainda não atingimos as 10 mil.”

A situação torna-se cada vez mais complexa se se tiver em conta o envelhecimento da população, que, face a várias doenças crónicas, precisa de cuidados de saúde na Rede. “É grave, porque estamos a falar de pessoas frágeis e vulneráveis, que dependem do SNS, e que levam ao aumento dos internamentos sociais.”

Além de ser urgente ter mais camas, o responsável alerta também para o financiamento da RNCCI. “Os valores pagos pelo Estado estão desadequados e, sendo a RNCCI uma rede pública, tem de ser o Estado a garantir a sua continuação ou não estivesse a recorrer ao setor social – assim como ao privado – para transferir utentes que ocupam vagas nos hospitais apesar da alta clínica.”

Lembre-se que, de acordo com os últimos dados, 60% dos doentes internados que não abandonam os hospitais são casos sociais. Para Manuel Lemos, “está a falhar mais uma vez o planeamento dos portugueses” que pensam “a quatro anos, cinco anos” e não a 30 anos, como afirmou no 14.º Congresso Nacional das Misericórdias, em julho deste ano.

Uma outra área em que já existe alguma cooperação entre público e social é nos cuidados primários, com o Projeto Bata Branca. “O objetivo é melhorar o acesso a cuidados de saúde primários (CSP), complementar a resposta do SNS e aprofundar a parceria entre o Estado e o setor social”, explica o presidente da UMP.

Criado em 2017, o Bata Branca atingiu um total de 5715 horas e 17 mil consultas, nos primeiros meses de 2023 (janeiro a maio de 2023) em Lisboa e Vale do Tejo, onde mais de 1,7 milhões de utentes não têm médico de família (dados do portal da transparência do SNS, maio 2023).

Para Manuel Lemos, estes números são uma prova de como é preciso apostar-se na criação de unidades de saúde familiar (USF) modelo C, previstas na lei. “Com estes cuidados de proximidade, em regiões onde o SNS não chega, temos conseguido melhorar o acesso a cuidados de saúde.”

Questionado se irá avançar com a criação de uma USF modelo C, diz que estão em diálogo com o Ministério da Saúde e que estão a ser “dados passos positivos”.

A assinalar os 44 anos do SNS, Manuel Lemos recorda ainda o papel das Misericórdias nos hospitais de proximidade. “Prestamos cuidados de qualidade e, inclusive, com tecnologia de ponta.” Espera, assim, que esta ligação se mantenha ao longo do tempo, porque, salienta, “contribuímos para a diminuição das listas de espera do SNS”.

Constrangimentos à parte, Manuel Lemos diz que a relação entre o público e o social já tem muitos anos e que, apesar das “fases de stop and go”, está num bom caminho. “A UMP acredita no SNS, contudo não achamos que os cuidados devam ser prestados somente pelo setor público.”

Como acrescenta: “Como indica a própria nomenclatura, o SNS é um serviço nacional, que tem de chegar a todos e, para tal, necessita do apoio do social – assim como do privado -, não se deixando de ter o Estado como garante de que todo o cidadão tem acesso a saúde.”

O presidente da UMP realça, ainda, o papel que esta interligação entre setores tem no que diz respeito à prevenção. “Se as pessoas tiverem acesso atempado a cuidados vão ter menos complicações ou até conseguem evitar determinada doença. A prevenção em saúde gera também poupança ao próprio Estado.”

MJG