“O SNS tem vindo a ser asfixiado progressivamente ao longo de vários e temo que já não seja viável.” As palavras são de José Poças, diretor interino do Serviço de Infeciologia do Centro Hospitalar de Setúbal, desde que há três meses pediu a demissão por ter sido “impedido” de expor a versão completa do seu estudo sobre o SNS. O médico infeciologista, com mais de 40 anos de Medicina, foi um dos oradores da Conferência “Será o SNS ainda viável?”, uma iniciativa da Ordem dos Médicos em parceria com a Nova SBE e o Nova SBE Health Economics & Management.
José Poças considera que “o SNS só seria (será?) viável se quem o conduziu à mais do que lamentável situação de completa agonia, tivesse ouvido quem devia e tivesse invertido o inexorável caminho de degradação vigente”. Mas deixa uma questão: “Ainda iremos a tempo?”
Na sua apresentação enumerou vários problemas que levam à saída dos médicos do SNS, como a falta de recursos humanos e materiais, mas também pontos que, diz, “devem ser esclarecidos” para se “corrigirem graves disfuncionalidades”. Exemplo disso é o facto de os doentes operados no setor privado através do “cheque-cirúrgico” serem, por vezes, enviados para centros “muito pouco acessíveis, e, muito pior, que não asseguram o tratamento das complicações decorrentes”.
Menciona ainda: “Uma obscena forma de reduzir a Medicina a um mero negócio é ganhar-se mais pelo pedido de exames auxiliares de diagnóstico, mesmo quando não são necessários.”
Critica também o número excessivo de faculdades de Medicina em Portugal, considerando que se devem formar apenas os médicos de que o país necessita. E aponta o dedo a “uma das principais doenças do SNS”, que, na sua opinião, é o “tarafeirismo”.
Na sua intervenção, José Poças falou do que defende para o SNS. Este deve ser o sistema nacional de saúde, no qual deve existir cooperação com outros setores, mas com regras transparentes e em complementaridade”. Deve também ser criado “um único seguro público de saúde universal e obrigatório”. Acresce, entre outras medidas, a necessidade de a inovação ser custo-efetiva, de existir um processo clínico único e melhor acesso a cuidados de saúde de proximidade, “um dos problemas que leva a população a recorrer mais às urgências”.
Quanto à dedicação plena, defendida pelo Governo, o médico responde com uma pergunta: “Alguém de bom senso ir-se-á entregar, conscientemente e de livre vontade, a um patrão em quem justificadamente não confia e que há muito que não o respeita?”
Concluindo, José Poças diz que é preciso que “o poder político reconheça que conduziu o SNS à inviabilidade por asfixia progressiva e abandono, mesmo sempre dizendo demagogicamente o contrário”. E mais: “Fazermos, em conjunto, uma refundação do SNS (tenha ele a sigla que tiver), assente nos valores da Universalidade, Equidade e Acessibilidade; e onde impere a humanização em vez do mercantilismo”.
LUSA
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