Diz-me que causa escolhes, dir-te-ei quem és. Se de entre todas as causas escolhes a causa antissionista, é porque muito provavelmente – mesmo que não o saibas – és antissemita. Se as atrocidades que o Hamas comete contra o próprio povo não te comovem, se o regime teocrático do Irão não te revolta por dentro, se o Hezbollah e o seu registo de morte e matança não te causa comoção, se a negação e repressão da individualidade das mulheres e a perseguição aos homossexuais não te afeta minimamente e se é ao Estado de Israel, ao Estado judaico, que atribuis toda a causa e origem dos problemas naquela região do mundo e que te leva para a rua a exigir uma Palestina “livre até ao mar”, então é porque – desculpa dizer-te, agora já o sabes – és sem dúvida antissemita.

É porque escolheste o lado, como escolheram o Hamas, o Irão e o Hezbollah, no qual não existe Israel. E um mundo sem Israel é um mundo sem judeus. Não há falhas nesta lógica. Nada há de errado em defender a criação do Estado da Palestina. Muitos israelitas e muitos judeus olham com benevolência para essa ideia, e defendem-na. Mas há tudo de errado em defender a criação do Estado da Palestina em simultâneo com a extinção do Estado de Israel.

Essa forma de anti-sionismo é antissemita, porque ao ódio a Israel soma-se o ódio aos judeus. Tiago Filipe Vivo Bento Lila, e mais 14030 pessoas, assinaram uma petição para “a interrupção das relações diplomáticas entre Portugal e o Estado de Israel” que será discutida hoje no Parlamento. Lê-se o texto dessa petição e nem uma palavra para os reféns ainda cativos serem devolvidos pelo Hamas, nem uma palavra de condenação pelos atos terroristas de 7 de outubro, nem uma palavra de solidariedade para com as famílias dessas vítimas, nem uma palavra para o corte de relações diplomáticas com a Palestina…

Apenas e tão só um lado, apenas e tão só o ódio contra Israel. A liberdade de expressão, de opinião e de petição que Tiago Lila e mais 14030 pessoas tiveram para avançarem com esta iniciativa em Portugal, não a teriam em Gaza, na Palestina, no Líbano e em diversas outras geografias que circundam Israel.

Põe a mão na consciência e pensa, com rigor e objetividade, quantas outras causas apoias hoje ou apoiaste no passado com tanto fulgor e vontade… pensa nisto, a partir da trincheira onde te encontras: se ignoras a agressão russa à Ucrânia; o conflito no Burkina-Faso que opõe o governo daquele país a grupos islâmicos radicais, como o Ansarul Islam, ligado à Al Qaeda, e ao Estado Islâmico no Sahel (ISS); o pesadelo humanitário no Sudão; se esqueces as odiosas perseguições aos rohingya no Mianmar; o terror dos raptos e chacinas em massa do Bohko-Haram na Nigéria; a morte e mutilação de crianças pelos Houthis no Iémen; o flagelo e atrocidades da longa guerra civil na Síria; se ignoras, e esqueces isto tudo e se olhas tão só e apenas contra Israel, se é Israel o alvo de toda a tua militância e de todo o teu ativismo, se achas que em Israel deve haver desinvestimento, sanções e boicote, se berras de pulmões abertos por uma Palestina “livre do rio até ao mar” então é porque és mesmo antissemita.

E não, aqui chegados, não acredito que sejas antissemita porque criticas e te mobilizas contra Israel. Acredito, isso sim, é que por seres antissemita, é que tens a posição que tens sobre Israel. Pensa duas vezes nisto e se acreditas mesmo, assume-te. Assume que na floresta da indiferença de todos os males e horrores do mundo os teus olhos estão apenas postos em Israel. Olha-te ao espelho. É um antissemita que vês. Continua a tua luta por uma Palestina “do rio até ao mar”. Assim, como tu te viste, também todos poderão ver o antissemita que tu és.

Presidente da Comunidade Israelita de Lisboa